É muito comum olharmos de fora do cenário Black Metal e
termos uma visão completamente errada do que realmente é o estilo. Conversamos
com Tanatos, vocalista e guitarrista da banda Creptum, que nos atendeu
prontamente e se mostrou um cara ligado com o cenário como um todo e também
deixou em claro, o que o Black Metal e sua banda, Creptum, significam para ele.
Confiram
Heavy Metal Breakdown: Antes de começarmos, obrigado pelo
seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, fale-nos sobre você
e suas atividades.
Tanatos: Primeiramente, eu que agradeço pelo espaço e apoio.
Sou vocalista, guitarrista e um dos fundadores da banda Creptum.
A ideia de criar o Creptum surgiu em 2001 junto com Animus
Atra (atualmente baterista) com a amizade e afinidades na música e de
ideologias que temos desde adolescente. Nessa época, escutávamos muito bandas
como Slayer, Marduk, Dark Funeral, Immortal e isso fez com que crescesse uma
vontade de, à nossa maneira, poder tocar e dizer coisas como eles.
Sempre estudei e trabalhei com design, isso ajudou bastante
a criar uma identidade para o Creptum, não só musical, mas também estética.
Depois de gravar a demo "...make this world burn"
em 2003 e com o aumento gradativo da quantidade de shows, decidi, por motivos
pessoais, me afastar da banda. Assim, não só me afastei da banda, como também
da cena. Deixando o Creptum nas mãos do Animus. Depois de quase nove anos sem
contato direto, nos encontramos casualmente e vimos que a amizade e a ideia do
Creptum, poderiam voltar com uma força ainda maior, visto nossa experiência de
vida adquirida nesses anos.
Nesta nova reunião, preparada com paciência e cuidado,
procuramos adotar uma nova postura (inclusive visual) para a banda, não é mais
um projeto de adolescente. Estamos mais velhos e o negócio não é ser
'rockstar'. Queremos espalhar o metal negro ríspido e cru, porém com
profissionalismo e maturidade. Ainda abordamos temas como ocultismo e,
principalmente o desprezo aos dogmas religiosos, sabendo que isso é um assunto
muito mais profundo do que simplesmente pintar a cara e dizer que vai matar
todo cristão no mundo.
HMB: O que você acha de bandas que banalizam o ocultismo e a
ciência negra e partem para a agressão propriamente dita? Não seria por casos
como este que o público em geral tem uma visão um tanto distorcida do que o
Black Metal se tornou?
Tanatos: Não acho que seja apenas uma banalização. Vejo mais
como uma dificuldade de interpretar as coisas. Se você pegar uma religião de
dogmas como o cristianismo, "virar de ponta cabeça" e começar a cagar
regras e verdades absolutas, você faz exatamente as mesmas coisas, não há diferença.
Talvez seja por isso que, uma grande parte das pessoas com a mente mais fechada
tendem em abandonar o estilo e se juntar à religião. Há uma necessidade de
seguir regras, e fica difícil se desvincular. Acredito que uma emancipação do
ser humano seja a ideia mais próxima de um Black Metal puro.
HMB: Não é desestimulador para você, ver essa fraqueza nos
seres humanos e saber que você leva a ideologia apenas aos já
"convertidos"?
Tanatos: Sinceramente não. Posso tocar pra dez pessoas, isso
pra mim está de bom tamanho. Se a pessoa teve algum interesse no Creptum, seja
pelo som, letra ou até pela capa do disco, sei que esta pessoa tem alguma coisa
em comum com nossa ideologia e isso já me deixa satisfeito.
HMB: E na sua visão, como é o cenário Black Metal, como um
todo hoje?
Tanatos: Atualmente vejo com bons olhos. Apesar do que
falamos anteriormente, sobre uma interpretação equivocada do estilo por algumas
pessoas, o cenário nacional é muito rico.
Tendo em vista o acesso mais fácil às grandes nomes
internacionais, que agora veem com mais frequência ao Brasil, o cenário
nacional precisou sair um pouco do amadorismo e criar uma maturidade.
Grande parte das bandas aqui que não devem nada para as de
fora. A qualidade é notada desde as gravações de alto nível e até na parte
gráfica dos álbuns e demos , e sou extremamente chato com isso (risos).
HMB: E como tem sido o comparecimento do publico aos shows?
Tanatos: Vou responder pelos eventos que tenho ido, pois o
Creptum voltará aos palcos somente em novembro.
Apesar da grande qualidade da maioria das bandas nacionais,
não vejo uma presença efetiva do público. É claro, em alguns shows
internacionais isso muda de figura, mas aí é que está à dificuldade das bandas
brasileiras, a galera fala muito de apoio à cena underground, mas poucos o
fazem de verdade. Gastam-se um bom dinheiro em ingressos onde no cast colocam
apenas uma ou dias bandas locais e, em eventos undergrounds onde o ingresso é
10/20 reais a galera não comparece com a mesma frequência.
Como espectador, é claro que gosto de ver as bandas que
nunca pensei em ver ao vivo, os que poderiam equilibrar são os produtores, dar
mais espaços pra bandas novas aparecerem em vez de inflar um festival com 5
bandas gringas e uma única brasileira. Um grande exemplo positivo é o Zoombie
Ritual, um festival de grandes proporções com 15 atrações internacionais, porém
são quase 30 bandas nacionais. Mais eventos como este poderiam rolar por todo o
país.
HMB: Será que a condições tributárias do nosso país, impede
uma maior realização desse tipo de evento?
Tanatos: Nossa questão tributária é bem complicada mesmo,
mas não pode ser usada como desculpa sempre.
Existe, é claro, uma dificuldade financeira em produzir um
evento de qualidade, mas o interesse em fazer um festival com determinadas
bandas internacionais e não equilibrar o cast com bandas daqui é escolha da
organização do evento.
A questão é aproveitar a oportunidade onde é esperada a
presença do público em maior número, como shows internacionais, para poder dar
uma força às bandas locais.
Já cheguei a ouvir casos que há produtores cobrando para
colocar bandas nacionais para abrir shows gringos. É inadmissível que uma banda
precise pagar para ter espaço junto a bandas internacionais no Brasil!
HMB: Concordo com você! Como você usa a internet como
ferramenta para a divulgação do seu trabalho?
Tanatos: É impossível não usar as ferramentas web.
Principalmente para bandas independentes como nós.
Atualmente fazemos uso dos principais canais como: facebook,
youtube, bandcamp, reverbnation, lastfm, bandsintown (que, aliás, é uma das
ferramentas que considero mais interessantes para bandas atualmente), instagram
e outras mais...
Até muito pouco tempo atrás, coisa de dez anos, ainda era
bem difícil conseguir material de bandas independentes. De lá pra cá, essas
ferramentas só fizeram ajudar na divulgação.
Recentemente li uma entrevista com o vocalista do Emperor,
Ihsahn, falando que com a internet perdeu-se o mistério por trás das bandas de Black
Metal, concordo que hoje o acesso aos "ídolos" ficou mais fácil, mas
isso é positivo. É fácil dizer isto quando as tais bandas obscuras sempre
tocaram na sua cidade. Quando adolescente comprava revistas gringas mais
antigas nos sebos próximos à galeria do rock pra conhecer essas bandas. A
internet trouxe isso mais próximo de nós, e como banda independente, levou o
Creptum para onde eu nunca pensei que fosse chegar.
HMB: E com a facilidade de acesso, não teria o público,
banalizado o acesso às informações e se acomodado, já que basta querer e estão lá,
fotos, releases, CDs completos?
Tanatos: Não vejo dessa maneira. Talvez porque sempre fui
daqueles que não importa se tivesse acesso à tudo de uma banda, vê-la ao vivo
sempre me agradou muito mais. E não só as grandes bandas de fora.
Tenho muita amizade com o pessoal do Amazarak e o Paolo do
Desdominus, por exemplo, e mesmo tendo acesso direto a eles, vê-los tocando ao
vivo é sempre gratificante.
Facilitar o acesso ao que oferecemos, é um dever nosso. Não
é porque em outros tempos era mais complicado e "suado" para
conseguir as coisas que vou querer que uma pessoa interessada no Creptum, passe
por isso. Fazemos música para ser ouvida, não importa se é em CD original, mp3
via torrent, youtube ou ao vivo.
HMB: O Creptum lançou duas demos em 2003 e 2004 e só voltou
a lançar material agora em 2014, por que a demora?
Tanatos: Eu deixei o Creptum em 2004 mesmo, pouco antes da
gravação da 2ª demo. A banda continuou com outra formação até meados de 2005.
Após isso, o pessoal foi deixando de ensaiar até pararem de vez. Animus já
estava no Carpatus e Nefus estava envolvido em outros projetos. Aí apenas em
2012, se não me engano, foi que reencontrei os dois ocasionalmente. Ali
percebemos que o Creptum poderia voltar, e com a formação mais próxima da
original.
HMB: E você percebeu uma evolução na cena, de 2005 para cá,
ou quando voltou, sentiu que tudo ainda era igual?
Tanatos: Bom, posso dizer qu houve sim uma evolução.
Principalmente quanto à quantidade e qualidade dos shows. Mas houve uma ligeira
diminuição do público. Fui inúmeras vezes à Fofinho aqui em São Paulo com casa
cheia, a galera dando apoio de verdade. Recentemente, em um evento lá, com
bandas de altíssima qualidade e que raramente tocam em SP, porém o público
deixou muito a desejar, a casa estava bem vazia.
HMB: Planos para o futuro?
Tanatos: Atualmente estou focado na volta aos palcos, que
vai ocorrer em novembro com o Creptum. Já fechamos mais algumas datas e em
paralelo trabalhamos em um material totalmente inédito para ser lançado no
primeiro semestre de 2015.
HMB: Resuma Tanatos em uma frase ou palavra.
Tanatos: Verdadeiro. Não estou aqui de brincadeira.
HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este
belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Tanatos: Gostaria de agradecer a oportunidade e o apoio que
tem dado não só a mim e ao Creptum, mas à cena underground como um todo. Essas
atitudes que deveriam ser mais vezes repetidas.
Peço aos leitores do HM Breakdown que participem, apoiem
efetivamente a cena. Vá aos shows do seu bairro, conheça as bandas à sua volta
e valorize-as.
Vida longa ao metal underground!
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