quinta-feira, 10 de julho de 2014

Lary Durante, ...o que a gente faz, fazemos porque amamos mesmo!


Lary Durante, baterista da banda de Punk Rock / Hardcore Ratas Rabiosas, colaboradora da Hi Hat Magazine e apaixonada por música e arte. Num bate papo muito inteligente, Lary se mostrou antenada com a nossa realidade e muito mais que isso, nos mostrou, novamente, que as pessoas que ficam, lá atrás do praticável, tem muito, mas muito mesmo a dizer. Confiram!

Heavy Metal Breakdown: Antes de começarmos, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, fale-nos sobre você e suas atividades.
Lary Durante: Imagine, eu é quem agradeço a oportunidade deste bate papo.
Bem, me chamo Larissa, mais conhecida como Lary ou Larys, tenho 24 anos e moro na cidade de São Paulo.
Sou baterista da banda de Punk Rock / Hardcore, Ratas Rabiosas, colaboradora da revista eletrônica Hi Hat Girls Magazine que é uma revista totalmente voltada para bateristas mulheres, e essas são as atividades (não remuneradas, risos) que eu exerço com muito amor e carinho!
Além disso, sou formada em Comunicação e Marketing, mas infelizmente não atuo profissionalmente na área. Sou apaixonada por música, comunicação, arte de rua, e movimentos culturais. Adoro conhecer gente nova e bandas, fazer amizades, bater um papo legal e frequentar shows de rock pesadão (risos)!

HMB: Como é ser baterista de uma banda de Hardcore feminina? Já que este é um mundo masculino e extremamente machista?
Lary: Bem, desde quando comecei a tocar bateria até hoje nunca rolou algo que fosse ofensivo, desagradável em relação ao machismo.  Pelo contrário, sempre fui tratada com respeito e amizade, de igual pra igual, nunca tive e nem quero ter privilégios por ser uma mulher baterista. Carrego meus equipamentos pesados, monto e desmonto tudo sozinha, sem fazer doce, sem reclamar, pois essa foi minha escolha. É claro que para quem não conhece muitas mulheres que tocam bateria é um tanto quanto curioso né, mas ninguém nunca chegou até a mim de forma desrespeitosa não.
Mas que o machismo é presente no Hardcore, punk, metal, grind, Rock n' Roll , no underground no geral isso é fato,  porém  hoje em dia tento encarar essa questão com um pouco mais de "leveza", apesar do machismo ser um assunto sério! Por exemplo, eu acredito que a melhor maneira de responder a um cara que cria um grupo no Whats App titulado de "KINGS" para expor a intimidade das mulheres "pagando de comedor", é ironizando, fazendo uma letra que exponha a sua opinião a respeito disso, de repente com a sua letra, sua música você atinja a mais pessoas e as coloque para pensar um pouco a respeito do assunto. Ficar se fazendo de vitima, coitadinha, não é a melhor forma de se impor e combater o que lhe incomoda, o que lhe faz mal.


HMB: Mas você não acha que muitos desses detratores e engraçadinho do cenário, se escondem por trás do anonimato que a rede permite?
Lary: Ah sim, sem dúvida! É fácil pra caramba ser machista, ou "Hater" atrás de um computador né. Na rede você é o que você compartilha, mas na vida real o que te define são as suas atitudes.

HMB: Qual é a sua visão do cenário da música pesada hoje?
Lary: Em relação às bandas, acho muito bom! Temos excelentes bandas, excelentes músicos, e alguns espaços bem legais para tocar.
Agora em relação à organização de eventos e ao pensamento do público no geral, eu acho que ainda há muito que se melhorar sim!  Sair de casa e ir tocar para mim é sempre um desafio, pois eu nunca sei o que vou encontrar (risos)! Já cheguei para tocar em lugares que não tinha bateria, não tinha equipamento de som, ( "Era um showzinho muito engraçado, não tinha batera não tinha nada!", risos), tive que mostrar meu lado Punk (D.I.Y.) e improvisar uma bateria com caixote, cadeira, e uma "estante humana"  pra fazer um som porque colou uma galera de longe para assistir nosso show. Já improvisei ferragens com pneus também. Sou quase uma Macgyver (risos)! Fora as baterias tortas, quebradas, caindo aos pedaços, emendadas com fita, que destrói a coluna do peão né?! Mas tamô aí, né?
No geral, não ter um equipamento decente, atrasos de horas nos shows, entre outras, são coisas que eu acho broxante, considero uma falta de respeito com a banda.  Não estou dizendo que eu quero cachê, camarim com frutas da época, Chandon, toalhas brancas felpudas (risos), e sim o mínimo que uma banda precisa ter para tocar. Afinal, antes de a banda subir no palco, ela gastou uma grana com ensaios, transporte e é tudo muito caro.
Fora a galera que fica na porta do show enchendo a cara (risos), não entra para ver as bandas, e ainda reclama, fica cornetando, sabe?!  Reclama que não tem show, mas quando tem não vai, e quando vai ao invés de entrar no show para ver as bandas, fica na porta. Vai entender...
Acredito que essas observações que fiz, são observações bem recorrentes né?!  Todos que tem o já tiveram banda sabem como é, ou tem alguma história do tipo para contar. Não dá pra viver do underground no Brasil. O que a gente faz, fazemos porque amamos mesmo! Não há lucros, só prejú (risos).

HMB: Sim, são observações bem correntes, pelo menos aqui no HMB! Como você se decidiu pela bateria, já era uma paixão antiga?
Lary: Então, meu primeiro contato com um instrumento foi aos 10 anos quando entrei na Fanfarra da escola, eu tocava pratos, adorava aquilo, depois passei para a caixa, e quando ia para bateria, a fanfarra estava precisando de trompetista então eu resolvi passar para os instrumentos de sopro. Toquei trompete dois anos, trompa dois anos. Mais tarde surgiu a oportunidade de aprender a tocar violoncelo em um projeto da orquestra do Pão de Açúcar, esse estudo durou dois anos também. Foram experiências bem maneiras, pois tive a oportunidade de conhecer, e estudar música erudita, aprender teoria musical, partitura, história da música e etc, tudo isso era fascinante. Os anos passaram eu fui ficando grandinha e tive que me afastar um pouco da música para trabalhar (risos).  Quando tudo já estava mais ou menos encaminhado, estava terminando a escola, e já tinha me adaptado à rotina de trabalhar e estudar, eu percebi que ainda estava faltando alguma coisa na minha vida, pois eu não estava feliz. Faltava uma peça para o quebra cabeças.  Então decidi voltar a estudar música. Como tinha um grupo de "amigas" que estavam a fim de montar uma banda de punk rock, talvez tenha me motivado a voltar a tocar. Optei pela batera porque era algo "pendente" na minha vida, algo que com 10 anos de idade eu quis aprender, mas não dei muita atenção na época. Entrei para um conservatório musical, e fui estudar bateria, a banda nunca vingou (risos), se quer teve seu primeiro ensaio, mas eu estava decidida a resolver essa pendência, e desde então não parei mais, e estou tentando resolvê-la até hoje (risos)!


HMB: Você acha que o ensino musical nas escolas públicas, seria um grande incentivador para o crescimento cultural do país, que apesar de rico neste aspecto, sofre de uma desvalorização pelo próprio povo?
Lary: Sem sombras de dúvidas! Afirmo com propriedade, pois sou fruto disso. Estudei a vida toda em escola pública e sempre participei dos projetos da escola, hoje eu sei o diferencial que isso me trouxe como pessoa. A bagagem cultural que carrego, devo a todo o aprendizado que adquiri com esses projetos.  Estudei tudo o que pude e achava um barato! Fiz música, teatro, dança, programa de rádio, tudo isso me agregou muito. Um dia espero poder retribuir a tudo de alguma forma. Gostaria muito que em todas as escolas publicas, sem exceção, tivessem projetos iguais aos que eu participei, pois sei o diferencial que isso traz para a criança/adolescente, sei o quanto agrega. Uma criança que aprende música, ou qualquer outra forma de arte, tem um universo de possibilidades a sua frente. Através da música que aprendi na escola tive a oportunidade de conhecer lugares diferentes, fazer amizades, entre outras coisas. Essa convivência toda, com um universo de possibilidades me deixou desinibida, e isso me ajudou bastante a enfrentar as dificuldades acadêmicas, a ter disciplina, pois se eu fosse mal, nas aulas corria o risco de não poder mais participar dos projetos, coisa que eu não queria, pois eu gostava muito. Sempre detestei matemática, a música conseguiu me ajudar até nisso, pois para tocar eu precisava contar os tempos (risos)! Acredito que a música traz essa leveza ao aprendizado no geral, além de aprender a contar o tempo (risos), eu aprendia a analisar as letras das músicas, aprendi a desenvolver o senso crítico, analisar, formar opinião, e expressá-las abertamente. Por esse motivo que eu acredito e defendo essa tese.

HMB: O ensino musical foi banido em 1970, desde então vem ensaiando uma volta, e só existem aulas de música em algumas escolas públicas por iniciativa das pessoas de lá. Qual seria o caminho para que o ensino musical voltasse a fazer parte do currículo normal?
Lary: O caminho seria investir forte nos três "I's": Informação, Iniciativa, e Interesse.  Acredito que se as pessoas soubessem a importância e os benefícios que a música proporciona na questão do aprendizado acadêmico e desenvolvimento social, cultural e talvez acreditassem mais nessa tese, com isso apareceriam mais projetos que aguçariam a curiosidade e o interesse da molecada, e então todos abraçariam a causa com certeza.

HMB: E como você vê o ensino público de uma forma geral?
Lary: Calamidade! 
Mas o que se esperar de um país, onde um jogador de futebol ganha milhões por mês e é visto como "rei", e um professor que tem papel fundamental na educação e formação dos cidadãos, ganha uma mixaria e é visto como um nada? O professor vive de migalhas, é humilhado, maltratado, ofendido, desrespeitado e muitas vezes agredido dentro da sala de aula, e isso é muito triste, é lamentável mesmo!  Admiro muito essa profissão. Acho que os professores que dão aula na rede pública são verdadeiros guerreiros, são heróis, e dão aula, pois realmente amam o que fazem, porque não e fácil. E tudo isso tudo é reflexo de um povo sem cultura e desse grande descaso do governo.


HMB: E na verdade, não existe interesse no bem estar da população. Você consegue visualizar um futuro melhor para este país, ainda dentro das próximas três ou quatro gerações?
Lary: Poxa, por mais que eu tente, não consigo ver ou acreditar nessa melhora, isso pra mim é uma grande utopia. Cada dia que passa, vejo mais retrocesso.

HMB: E de onde vem essa visão tão pessimista da nossa realidade?
Lary: (risos) Na verdade é uma visão realista. É que a nossa realidade é péssima (risos), por isso soa como pessimismo.
Não dá para acreditar num futuro melhor de um país onde os governantes abandonam seu povo, e os deixam "viver" em situações desumanas. E o povo covarde, de certa forma se adaptou, e aprendeu a conviver e sobreviver na desgraça sabe?! É cultural isso, e faz parte do famoso "Jeitinho Brasileiro de ser", de se adaptar rápido, se adequar as diversas situações, de dar um jeito de se virar mesmo em situações extremas. Tem um lado positivo nisso? Tem claro! As pessoas aprendem a se virar logo cedo, e isso é bom, porem se acomodam, e aceitam facilmente até aquilo que lhes prejudicam, que lhes fazem mal, e isso não é bom. Querer levar vantagem em tudo, ser mais esperto que os outros também é um agravante, para mim uma pessoa que fura uma fila, que embolsa um troco que veio a mais, é tão corrupta quando o político que rouba a grana do  povo.
Especular e acreditar, em uma melhora, é como dar soco em ponta de faca.  A massa vive em tempos de apatia, de agonia, com cérebros atrofiados, e um povo assim é mais fácil de ser manipulado, e acredito que, seja exatamente isso que os governantes querem, um povo sem informação, sem cultura, doente, jogado as traças.
Por mais que tenham Brasileiros iludidos, que pregam e acreditam em uma melhora, no fundo, no fundo até eles já sabem que a "merda" já está feita. E que não! Não haverá progresso, não haverá futuro. A banda Olho Seco já propagava isso nos anos 80: "Mãos estendidas, mãos trêmulas, de um corpo fraco, mostrando sempre a palma da mão".

HMB: Você crê que a conscientização das massas seria um primeiro passo para uma reorganização do Estado, ou isso também é utopia?
Lary: Sim, apesar de acreditar que esse trabalho de conscientização das massas seria um trabalho de formiguinha. Mas de fato seria um primeiro e memorável passo.


HMB: Planos para o futuro?
Lary: Bem, tenho alguns planos e projetos pendentes (risos).
Vou entrar em processo de gravação nos próximos meses, para lançar o primeiro trabalho da  minha banda, participaremos também de uma coletânea. Pretendo dedicar um tempo aos estudos baterísticos, e mais para frente produzir uns vídeos fazendo play along e postar no youtube, um dos vídeos que pretendo produzir será em parceria com um guitarrista muito supimpa da cena do "Hardcorepunkmetalgrind-crust666motherfuck" (risos), o Fábio da banda Sistema Sangria, penso em fazer algo com a mulherada da batera também. Fora a revista, Hi Hat Girls Magazine, né? Continuar divulgando o trabalho da mulherada baterista, incentivar, apoiar, e buscar novas parcerias para quem sabe um dia realizar nosso sonho de torna lá física, real.

HMB: Resuma Lary Durante em uma frase.
Lary: Batatinha quando nasce (risos), brincadeira.
Uma das frases que me define é "Quem tem vontade, tem metade”.

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para nossos leitores.
Lary: Ahhh, já acabouuuuu (risos)? Poxa, eu é quem agradeço à você JP e a HMB pelo espaço e oportunidade cedida a mim, muito maneira mesmo a sua iniciativa. Eu adorei, nosso bate papo, foi bem divertido. Aos leitores da Heavy Metal Breakdown, um grande abraço! Espero que tenham curtido, e aproveitem esse espaço, aproveitem as oportunidades de adicionar com quem está a fim de fazer a cena do Rock Pesado se movimentar, sem por a frente interesses pessoais. Vamos fortalecer o Underground, usar todos os espaços e ferramentas disponíveis a nosso favor.  União, Igualdade e Respeito acima de tudo!
Quem quiser conhecer o som da minha banda e o trabalho que faço na revista deem uma acessada:

Banda Ratas Rabiosas:

Hi Hat Girls Magazine:


Valeu! É nóis!

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Tão novinha e com tanto conteúdo!!! Grande entrevista, parabéns moça!!!

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  3. Jovem, mas sabe o que quer. Ama o que faz. Adorei a frase que a define "quem tem vontade, tem a metade" Parabéns, Lary e sucesso na sua trajetória!

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  4. Jovem, mas sabe o que quer. Ama o que faz. Adorei a frase que a define "quem tem vontade, tem a metade" Parabéns , Lary e sucesso na sua trajetória!

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