Tom Angelripper e Marco Antonio Garcia |
Desta vez entrevistamos o multitarefas
Marcos Antonio Garcia, que além das diversas atividades que exerce na vida, leva
a frente o blog Metal Samsara, munido de muita paixão e conhecimento de causa,
Marcos nos falou de diversos assuntos, e mostrou que não foge da briga nunca e
que tem muita a dizer sobre tudo. Confiram a seguir:
HM Breakdown: Antes de tudo, obrigado pelo seu
tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, nos fale sobre você e
suas atividades.
Marcos Antonio Garcia: O prazer é todo do Pai Marcão aqui, e
agradeço demais pela oportunidade.
Bem, eu sou Marcos Garcia, se bem que todos já sabem disso
(risos), 43 anos de idade, 30 de Metal, e a cabeça do Metal Samsara, além de
colaborar com a Rock Brigade, Hell Divine, e no site europeu Metal Temple.
Essas seriam minhas atividades ligadas ao Metal, mas eu carrego comigo tenho a
concepção que o headbanger tem que se melhorar cada dia, então, sou formado em
Física (como Licenciado e Bacharel) pela UFF (Universidade Federal Fluminense)
do RJ, Mestre em Geomagnetismo pelo Observatório Nacional do Rio de Janeiro e
estudante de Doutorado. Já trabalhei em pré-vestibular comunitário, porque acho
que devemos fazer um pouco por aqueles que buscam ter uma chance nesse mundo
que temos. E sim, eu estudei em escolas públicas comuns nos Ensinos Fundamental
e Médio, por isso não vivo reclamando da ausência de chances.
No mais, sou apenas mais um dos muitos fãs de Metal da velha
guarda, mas sem ficar enchendo o saco, com pseudo-ideologias e achando que as
coisas eram boas no passado. O melhor tempo é aquele em que vivemos e ainda
vamos viver. O passado é professor, o futuro é aquela mulher boazuda e bonita
que todos querem, e o presente é o caminho que usamos para tentar chegar até
ela... Ou não, pois podemos terminar pegando a vovozinha (gargalhadas).
HMB: O que você acha da cena musical brasileira, e você
acredita que um ensino de qualidade e melhores perspectivas de futuro,
tornariam a cena musical brasileira como um todo, melhor do que ela é?
Marcos Garcia: Particularmente, acho a cena musical
brasileira fantástica!
Todos os dias vejo surgir ótimas bandas, com qualidade acima
da média internacional, e capazes de satisfazer o fã mais exigente, só bastando
alguns fãs largarem a mania do Brasil-Colônia de que "o que é bom vem de
fora". Sim, isso é velho, um costume que herdamos dos colonizadores, já
que eles, por serem de Portugal, sentiam saudades de sua terra e o clima e
condições de nosso país, na época, eram ruins. Mas hoje em dia, com tudo encima
e bandas ótimas surgindo e lutando no underground, com trabalhos disponibilizados
gratuitamente pela internet, e o cara ainda vai ficar babando gringo??? Poupem
os pentelhos do meu saco velho e enrugado disso! (gargalhadas)
Pô, Seventh Seal, Panzer, Dinahead, Necromesis, Spreading
Hate, Darktower, Vociferatus, Hatefulmurder, Symphony Draconis, e músicos como
Wael Daoun, Cauê Leitão, e o infelizmente falecido Paulo Schroeber, Fabiano
Penna e tantos outros estão em níveis ótimos. Acho que só serão valorizados
depois que acontecer o "efeito Sepultura": a banda faz sucesso lá
fora, aí o banger brazuca abraça. É o fim da picada...
Bem, o ensino ajuda em tudo, dá uma dimensão maior de
realidade, mas é preciso também que o headbanger (metaleiro é a mãe da repórter
que criou o termo) encare seu meio com seriedade, que vá aos shows, compre
discos, revistas e zines, e deixe de ser tão ranzinza e reclamão de certas
coisas. Não é porque não tem cerveja na casa que você vai deixar de prestigiar
um bom show, e lembro que a fiscalização depois do infeliz incêndio da boate
Kiss em Santa Maria anda à toda. Um cabelo fora do lugar e eles fecham a casa
sem dó. Ou seja, é necessário que abrace esta causa, esta luta, e eu não aceito
mimimi por nada. Não é possível que lotemos dois dias de Rock in Rio e o
Monsters of Rock e os shows do nosso underground, das nossas bandas, fiquem tão
largados.
As melhoras virão sim, mas quando o público largar de ser
segmentado e reclamão sem motivos. E reclamar não contribui em nada para
melhora, pois quem critica e nada faz é um panaca. E quem vive nessa onda
"só curto essa vertente de Metal", para dar uma de true, é outro
pastel. Conheço amigos que gostam de uma única vertente por identificação
pessoal deles, e não o inverso, ou seja, se adequam ao estilo, e esses, eu não
critico. Eu mesmo ouço Black Sabbath, Kreator, Sodom, Motley Crue, Judas
Priest, Rush, Fear Factory, Cradle Of Filth, Mayhem, Manowar, Bon Jovi,
Firehouse, Burzum, Suicidal Angels, e
gosto de todos eles, assim como tenho imenso prazer de ouvir Yekun, Woslom,
Panzer, Headhunter Dc, Symphony Draconis, Glitter Magic, Lacerated And
Carbonized, Jackdevil, e tantos outros. Vou do Hard mais farofa e AOR até o
mais extremo Black Metal sem pudor algum, e sem problemas. Quando todos
encararmos as bandas de Metal como bandas de Metal, e não pelas vertentes,
seremos felizes e estaremos em um patamar que certos estilos mainstream não
estão. Simples assim: a união faz a força, e ponto final.
HMB: Quem sabe se houvesse uma reforma política no Brasil,
tudo não mudaria para melhor? Ou o povo, prefere as coisas como estão, afim de
não se desgastar com isso?
Marcos Garcia: Reformas, historicamente falando, transformam
opressores em oprimidos e vice-versa. Veja a marginalização dos militares
atualmente. Não acho correto por ser revanchismo.
Mudanças, antes de tudo, devem ser na mentalidade das
pessoas. Isso gera as mudanças que queremos para a sociedade e país. E isso tem
acontecido no Brasil, mas as atitudes precisam ser revistas. Não adianta sair
no braço com Polícia, Exército ou seja, lá quem for e outras pessoas, que nada
tem com isso, saindo feridas ou mortas. Ano passado mesmo, eu estava no show do
Cannibal Corpse aqui no RJ, e acabei levando gás na cara dentro do Circo Voador
(e as bandas Fórceps e Gangrena Gasosa tiveram que interromper seus shows por
isso. Era gás demais, e a enfermaria lotou), mas sei que a Polícia só fez isso
porque os manifestantes, após tentarem quebrar a Prefeitura do RJ e invadir o
Maracanã, estavam querendo invadir o Circo Voador. E se isso acontecesse, seria
muito pior.
Acho que é preciso uma revolução intelectual mesmo, de fato,
mas sem esse esquerdismo xiita que vemos em certos cursos em faculdades
públicas do país. Todo radicalismo ou fanatismo é sinônimo de burrice aguda. É
triste saber que temos tantos livros, discos e filmes ótimos, capazes de erigir
o melhor que há em nós, sendo deixados de lado em busca de um
pseudo-intelectualismo de esquerda cego. Precisamos aprender, de uma vez por
todas, as lições que pessoas como Chico Xavier, Madre Tereza de Calcutá e
Gandhi nos deixaram: a revolução começa quando queremos bem aos outros, o mesmo
bem que queremos para nós. E isso não é cristianismo, mas algo do ser humano.
Aliás, quem busca o melhor para formar suas ideias, acha em
qualquer lugar, filme, disco, livro, ou mesmo em conversas com amigos.
Ao povo, aqueles mais alienados, as mudanças nunca causam
realmente algo que os tire da inanição. Muda o governo, o presidente, a opinião
entre esquerda e direita, mas para eles, nada muda. Enquanto houver programas
como esses reality shows inúteis, novelas com nada de conteúdo e outros, eles
ficarão sempre inertes.
O brasileiro ainda pensa no que come e no que vê na
televisão. O resto ele dá um jeito...
HMB: A cena metal no Brasil é enorme, mas escassa dentro da
sua própria casa, você enxerga alguma mudança a curto prazo e quais serias as
atitudes, na sua opinião, que deveríamos ter para que essa realidade mudasse?
Marcos Garcia: Bem, a mudança parte da unidade, sem sombra
de dúvidas!
É triste saber que se alguém monta um festival com Hard, Thrash
e Death Metal no mesmo dia corre o risco de ser feito de piada, ou do público
fazer gracinhas. Cito o Ghost B.C. no Rock in Rio, vaiado por algumas poucas
(em relação ao público presente) "Metallicats" ou as
"brucetes" do Maiden fazendo o mesmo em SP. Pô, educação é O mínimo
que se pode conceder a alguém, bem como respeito ao trabalho dele. Não é porque
você não gosta que é ruim, então, respeite o trabalho alheio e os fãs dele. O
Facebook é uma amostra disso, pois o que já vi de piadas com Ghost B.c., Bullet
For My Valentine, Slipknot, Likin' Park e Avenged Sevenfold é de doer. E não,
esse direito de expressão não deveria existir, ou como digo, a liberdade de
expressão deveria ser limitada pelo respeito. Por exemplo, eu não gosto do
Avenged Sevenfold, não compraria os discos da banda, mas acho que eles fazem um
trabalho muito bom, tem seus fãs e eu respeito-os demais. E não, não os vejo
como frescos, adolescentes, nada disso. Vejo-os como fãs, e ponto final. Os
outros que depreciam bandas só porque não gostam, esses eu não vejo como fãs,
mas como quem carrega os problemas da falta de educação devida para a cena.
Um amigo meu que foi ao Wacken falou de uma banda que
ninguém estava gostando na época, e o que o público de lá fez? Sentou e ficou
olhando quieto, ou foram procurar uma bebida ou um "meet and greet".
E não vaiaram, não fizeram nada, deixaram a banda tocar seu set. E essa
diferença vem da educação de casa, já que o que tem de gente no Brasil parindo
para ter bolsa-família e outros benefícios não está no gibi, mas sem ter
responsabilidade com a vida que colocou no mundo. E me é triste demais ver uma
criança maltratada por pais inaptos, os "filhos do Lula"...
Falo da educação que a escola não tem como dar, a educação
que é independente de ser rico ou pobre, mas que vem de pais para os filhos. Eu
mesmo busco ser educado, e isso vem de meus pais, que eram uma tecelã e um
motorista de uma fábrica de tecidos. E olhando isso, não dou direito a ninguém,
seja por pobreza ou por dizer "não tenho tempo", de não educar um
filho ou reclamar da tarefa. Até porque se os pais que dizem "não tenho
tempo" desligassem a TV para cuidar dos filhos, os reality shows acabariam
sem audiência. Um BBB vale mais que um filho para muitos brasileiros...
E em curto prazo, não vejo nenhuma alteração em vista... Não
com as condições da cena em si e do próprio país em termos de educação e
economia...
As palavras para a mudança são: educação, respeito, e
aceitação do que não gosta como algo bom. Isso seria um bom início.
E sobre posers e falsos, me permita perder a linha:
falsidade eu não vejo pelo cara acreditar ou não em um deus, não por ser fã ou
não de determinada banda, mas por gerar modelos de pensamento e comportamento
errados.
HMB: E em se tratando das bandas de Heavy Metal, Você acha
que a qualidade dos trabalhos lançados estão em um nível de inferioridade aos
lançados nos grandes mercados?
Marcos Garcia: Não, não somos inferiores de forma alguma!
Óbvio que muitos dos produtores brasileiros ainda precisam
de aprender, talvez fazer um minicurso, com produtores de fora, para aprenderem
técnicas no estúdio. Mas temos ótimos resultados aqui, como o Panzer, que em
"Honor", fez uma produção animalesca com o Henrique Baboom. E ainda
tem o HIBRIA que fez tudo de estúdio do "Silent Revenge" no Brasil, o
Noturnall, que teve os próprios músicos na produção junto com o Russel Allen, o
Dinahead com "Chordata II", o Seventh Seal, o último do Andralls... E
ainda temos nomes emergentes de produtores como Felipe Eregion (que produziu o
EP "Blessed by the Hands of Flames" do Vociferatus, os irmãos Pirozzi
no PyroZ studio no RJ, o Luiz Freitag do AM Studio, o próprio Brendan Duffey
que fez o Hevilan... Temos pessoas que estão fazendo a diferença aqui, logo,
não perdemos para ninguém, só para o preconceito "o que é bom vem do
exterior" que muitos ainda teimam em carregar... A qualidade tem melhorado
ano após ano, lançamento após lançamento, mas lembremos também de respeitar
aquilo que a banda quer de uma produção. E isso nem sempre é fácil para muitos
aceitarem.
Marco Antonio Garcia e Jeff Walker, do Carcass |
HMB: Como você se relaciona com a Internet, tanto no seu
trabalho como na sua vida pessoal?
Marcos Garcia: Particularmente, acho a internet ótima, mas
acho que por ser um pouco mais velho, sei impor limites a mim mesmo. Não uso os
recursos de internet de celular, então, tenho uma vida fora do mundo virtual,
que me toma mais de 80-85% de meu tempo. E por meio dela faço ótimas amizades,
que acabo encontrando no mundo real.
O problema da internet é que ela acabou se tornando uma
parte essencial da vida de pessoas que necessitam se expor a todos, um
gigantesco reality show, onde nenhuma privacidade é respeitada. E isso não vai
apenas da questão de opinião (basta postar algo de sua opinião, e lá vem as
patrulhas do bom mocismo), mas canso de ver todos os dias as pessoas dizendo
"vou dormir", "indo para a academia", "indo para a
festa", sempre dando aberturas aos espertos que ficam em busca de vítimas.
Já vi vários crimes onde, de certa forma, o Facebook foi a ferramenta do
criminoso. É preciso impor limites a si mesmos.
E acho a net legal para a divulgação de trabalhos de bandas,
é essencial. Agora, sou inimigo declarado de downloads ilegais de discos e
DVDs, pois alguém investiu dinheiro para aquilo ser lançado. É uma questão de
justiça. Baixou, ouviu e gostou? Pague pelo material físico, ou mesmo pelas
versões digitais. Quem faz downloads ilegais e lota HDs com trabalhos autorais
não disponibilizados gratuitamente, é um ladrão: está roubando a banda, as
gravadoras, as lojas, a cena. E sem mimimi de cunho socialista, de querer dizer
que as bandas agora possuem domínio de seu material! Isso enfraqueceu de tal
forma as gravadoras que poucas são as que investem em discos novos. E vai
chegar a um ponto no futuro que se as próprias bandas não terão dinheiro para
investir. Ou seja, estão matando bandas como Sepultura, Sarcófago, Metallica,
Slayer e outros, pois no início, nenhum deles tinha um centavo para investir
gravações, prensagem e distribuição. Isso os socialistas da net não falam, não
é? E ainda deixo claro que os garotos do Sepultura não tinham dinheiro nem para
certas necessidades antes do sucesso lá fora. Se a Cogumelo não tivesse posto
dinheiro deles na gravação dos primeiros discos, bem como a Roadrunner também
fez, eles não seriam ninguém.
Alguém investiu, logo, trabalhou por isso. Pague esta pessoa
por seu trabalho, oras... Se não quer, que vá para a P%$# que os P@$#@ e fique
por lá. Não fará falta alguma...
HMB: Planos para o futuro?
Marcos Garcia: Muitos: Me tornar
Doutor na minha área, e continuar o bom e velho Pai Marcão, sempre lutando pela
unidade no Metal, na exposição do Metal como cultura e formador de opinião, bem
como real movimento e patrimônio cultural do Brasil.
E continuar sempre sendo o cara que gosta de tirar fotos com
bandas, colecionar palhetas e CDs, ter mais e mais amigos, e romper modelos de
pensamento que já faliram.
HMB: Resuma Marcos Garcia em uma frase
Marcos Garcia: "Esqueça o passado, não se preocupe com o futuro,
concentre-se apenas no futuro", de Buda, é a frase que melhor me define.
HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este
belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Marcos Garcia: Ora, o prazer é todo meu, e agradeço demais pela
oportunidade. Aos caríssimos leitores, deixo a mensagem: reclamar das coisas na
cena é perda de tempo e energia. Abrace a causa, estude, cresça como ser
humano. Compre revistas, CDs, camisetas, zines, leia boas referências em termos
de música, vá aos shows, apoie sua cena local sem restrições.
O Metal nos une, então, nada nos separará. In Union We
Stand.
Respeito demais esse cara!
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