quarta-feira, 2 de abril de 2014

Marcos Antonio Garcia: ácidez e opiniões

Tom Angelripper e Marco Antonio Garcia

Desta vez entrevistamos o multitarefas Marcos Antonio Garcia, que além das diversas atividades que exerce na vida, leva a frente o blog Metal Samsara, munido de muita paixão e conhecimento de causa, Marcos nos falou de diversos assuntos, e mostrou que não foge da briga nunca e que tem muita a dizer sobre tudo. Confiram a seguir:


HM Breakdown: Antes de tudo, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, nos fale sobre você e suas atividades.
Marcos Antonio Garcia: O prazer é todo do Pai Marcão aqui, e agradeço demais pela oportunidade.
Bem, eu sou Marcos Garcia, se bem que todos já sabem disso (risos), 43 anos de idade, 30 de Metal, e a cabeça do Metal Samsara, além de colaborar com a Rock Brigade, Hell Divine, e no site europeu Metal Temple. Essas seriam minhas atividades ligadas ao Metal, mas eu carrego comigo tenho a concepção que o headbanger tem que se melhorar cada dia, então, sou formado em Física (como Licenciado e Bacharel) pela UFF (Universidade Federal Fluminense) do RJ, Mestre em Geomagnetismo pelo Observatório Nacional do Rio de Janeiro e estudante de Doutorado. Já trabalhei em pré-vestibular comunitário, porque acho que devemos fazer um pouco por aqueles que buscam ter uma chance nesse mundo que temos. E sim, eu estudei em escolas públicas comuns nos Ensinos Fundamental e Médio, por isso não vivo reclamando da ausência de chances.
No mais, sou apenas mais um dos muitos fãs de Metal da velha guarda, mas sem ficar enchendo o saco, com pseudo-ideologias e achando que as coisas eram boas no passado. O melhor tempo é aquele em que vivemos e ainda vamos viver. O passado é professor, o futuro é aquela mulher boazuda e bonita que todos querem, e o presente é o caminho que usamos para tentar chegar até ela... Ou não, pois podemos terminar pegando a vovozinha (gargalhadas).

HMB: O que você acha da cena musical brasileira, e você acredita que um ensino de qualidade e melhores perspectivas de futuro, tornariam a cena musical brasileira como um todo, melhor do que ela é?
Marcos Garcia: Particularmente, acho a cena musical brasileira fantástica!
Todos os dias vejo surgir ótimas bandas, com qualidade acima da média internacional, e capazes de satisfazer o fã mais exigente, só bastando alguns fãs largarem a mania do Brasil-Colônia de que "o que é bom vem de fora". Sim, isso é velho, um costume que herdamos dos colonizadores, já que eles, por serem de Portugal, sentiam saudades de sua terra e o clima e condições de nosso país, na época, eram ruins. Mas hoje em dia, com tudo encima e bandas ótimas surgindo e lutando no underground, com trabalhos disponibilizados gratuitamente pela internet, e o cara ainda vai ficar babando gringo??? Poupem os pentelhos do meu saco velho e enrugado disso! (gargalhadas)
Pô, Seventh Seal, Panzer, Dinahead, Necromesis, Spreading Hate, Darktower, Vociferatus, Hatefulmurder, Symphony Draconis, e músicos como Wael Daoun, Cauê Leitão, e o infelizmente falecido Paulo Schroeber, Fabiano Penna e tantos outros estão em níveis ótimos. Acho que só serão valorizados depois que acontecer o "efeito Sepultura": a banda faz sucesso lá fora, aí o banger brazuca abraça. É o fim da picada...
Bem, o ensino ajuda em tudo, dá uma dimensão maior de realidade, mas é preciso também que o headbanger (metaleiro é a mãe da repórter que criou o termo) encare seu meio com seriedade, que vá aos shows, compre discos, revistas e zines, e deixe de ser tão ranzinza e reclamão de certas coisas. Não é porque não tem cerveja na casa que você vai deixar de prestigiar um bom show, e lembro que a fiscalização depois do infeliz incêndio da boate Kiss em Santa Maria anda à toda. Um cabelo fora do lugar e eles fecham a casa sem dó. Ou seja, é necessário que abrace esta causa, esta luta, e eu não aceito mimimi por nada. Não é possível que lotemos dois dias de Rock in Rio e o Monsters of Rock e os shows do nosso underground, das nossas bandas, fiquem tão largados.
As melhoras virão sim, mas quando o público largar de ser segmentado e reclamão sem motivos. E reclamar não contribui em nada para melhora, pois quem critica e nada faz é um panaca. E quem vive nessa onda "só curto essa vertente de Metal", para dar uma de true, é outro pastel. Conheço amigos que gostam de uma única vertente por identificação pessoal deles, e não o inverso, ou seja, se adequam ao estilo, e esses, eu não critico. Eu mesmo ouço Black Sabbath, Kreator, Sodom, Motley Crue, Judas Priest, Rush, Fear Factory, Cradle Of Filth, Mayhem, Manowar, Bon Jovi, Firehouse,  Burzum, Suicidal Angels, e gosto de todos eles, assim como tenho imenso prazer de ouvir Yekun, Woslom, Panzer, Headhunter Dc, Symphony Draconis, Glitter Magic, Lacerated And Carbonized, Jackdevil, e tantos outros. Vou do Hard mais farofa e AOR até o mais extremo Black Metal sem pudor algum, e sem problemas. Quando todos encararmos as bandas de Metal como bandas de Metal, e não pelas vertentes, seremos felizes e estaremos em um patamar que certos estilos mainstream não estão. Simples assim: a união faz a força, e ponto final.

HMB: Quem sabe se houvesse uma reforma política no Brasil, tudo não mudaria para melhor? Ou o povo, prefere as coisas como estão, afim de não se desgastar com isso?
Marcos Garcia: Reformas, historicamente falando, transformam opressores em oprimidos e vice-versa. Veja a marginalização dos militares atualmente. Não acho correto por ser revanchismo.
Mudanças, antes de tudo, devem ser na mentalidade das pessoas. Isso gera as mudanças que queremos para a sociedade e país. E isso tem acontecido no Brasil, mas as atitudes precisam ser revistas. Não adianta sair no braço com Polícia, Exército ou seja, lá quem for e outras pessoas, que nada tem com isso, saindo feridas ou mortas. Ano passado mesmo, eu estava no show do Cannibal Corpse aqui no RJ, e acabei levando gás na cara dentro do Circo Voador (e as bandas Fórceps e Gangrena Gasosa tiveram que interromper seus shows por isso. Era gás demais, e a enfermaria lotou), mas sei que a Polícia só fez isso porque os manifestantes, após tentarem quebrar a Prefeitura do RJ e invadir o Maracanã, estavam querendo invadir o Circo Voador. E se isso acontecesse, seria muito pior.
Acho que é preciso uma revolução intelectual mesmo, de fato, mas sem esse esquerdismo xiita que vemos em certos cursos em faculdades públicas do país. Todo radicalismo ou fanatismo é sinônimo de burrice aguda. É triste saber que temos tantos livros, discos e filmes ótimos, capazes de erigir o melhor que há em nós, sendo deixados de lado em busca de um pseudo-intelectualismo de esquerda cego. Precisamos aprender, de uma vez por todas, as lições que pessoas como Chico Xavier, Madre Tereza de Calcutá e Gandhi nos deixaram: a revolução começa quando queremos bem aos outros, o mesmo bem que queremos para nós. E isso não é cristianismo, mas algo do ser humano.
Aliás, quem busca o melhor para formar suas ideias, acha em qualquer lugar, filme, disco, livro, ou mesmo em conversas com amigos.
Ao povo, aqueles mais alienados, as mudanças nunca causam realmente algo que os tire da inanição. Muda o governo, o presidente, a opinião entre esquerda e direita, mas para eles, nada muda. Enquanto houver programas como esses reality shows inúteis, novelas com nada de conteúdo e outros, eles ficarão sempre inertes.
O brasileiro ainda pensa no que come e no que vê na televisão. O resto ele dá um jeito...

HMB: A cena metal no Brasil é enorme, mas escassa dentro da sua própria casa, você enxerga alguma mudança a curto prazo e quais serias as atitudes, na sua opinião, que deveríamos ter para que essa realidade mudasse?
Marcos Garcia: Bem, a mudança parte da unidade, sem sombra de dúvidas!
É triste saber que se alguém monta um festival com Hard, Thrash e Death Metal no mesmo dia corre o risco de ser feito de piada, ou do público fazer gracinhas. Cito o Ghost B.C. no Rock in Rio, vaiado por algumas poucas (em relação ao público presente) "Metallicats" ou as "brucetes" do Maiden fazendo o mesmo em SP. Pô, educação é O mínimo que se pode conceder a alguém, bem como respeito ao trabalho dele. Não é porque você não gosta que é ruim, então, respeite o trabalho alheio e os fãs dele. O Facebook é uma amostra disso, pois o que já vi de piadas com Ghost B.c., Bullet For My Valentine, Slipknot, Likin' Park e Avenged Sevenfold é de doer. E não, esse direito de expressão não deveria existir, ou como digo, a liberdade de expressão deveria ser limitada pelo respeito. Por exemplo, eu não gosto do Avenged Sevenfold, não compraria os discos da banda, mas acho que eles fazem um trabalho muito bom, tem seus fãs e eu respeito-os demais. E não, não os vejo como frescos, adolescentes, nada disso. Vejo-os como fãs, e ponto final. Os outros que depreciam bandas só porque não gostam, esses eu não vejo como fãs, mas como quem carrega os problemas da falta de educação devida para a cena.
Um amigo meu que foi ao Wacken falou de uma banda que ninguém estava gostando na época, e o que o público de lá fez? Sentou e ficou olhando quieto, ou foram procurar uma bebida ou um "meet and greet". E não vaiaram, não fizeram nada, deixaram a banda tocar seu set. E essa diferença vem da educação de casa, já que o que tem de gente no Brasil parindo para ter bolsa-família e outros benefícios não está no gibi, mas sem ter responsabilidade com a vida que colocou no mundo. E me é triste demais ver uma criança maltratada por pais inaptos, os "filhos do Lula"...
Falo da educação que a escola não tem como dar, a educação que é independente de ser rico ou pobre, mas que vem de pais para os filhos. Eu mesmo busco ser educado, e isso vem de meus pais, que eram uma tecelã e um motorista de uma fábrica de tecidos. E olhando isso, não dou direito a ninguém, seja por pobreza ou por dizer "não tenho tempo", de não educar um filho ou reclamar da tarefa. Até porque se os pais que dizem "não tenho tempo" desligassem a TV para cuidar dos filhos, os reality shows acabariam sem audiência. Um BBB vale mais que um filho para muitos brasileiros...
E em curto prazo, não vejo nenhuma alteração em vista... Não com as condições da cena em si e do próprio país em termos de educação e economia...
As palavras para a mudança são: educação, respeito, e aceitação do que não gosta como algo bom. Isso seria um bom início.
E sobre posers e falsos, me permita perder a linha: falsidade eu não vejo pelo cara acreditar ou não em um deus, não por ser fã ou não de determinada banda, mas por gerar modelos de pensamento e comportamento errados.

HMB: E em se tratando das bandas de Heavy Metal, Você acha que a qualidade dos trabalhos lançados estão em um nível de inferioridade aos lançados nos grandes mercados?
Marcos Garcia: Não, não somos inferiores de forma alguma!
Óbvio que muitos dos produtores brasileiros ainda precisam de aprender, talvez fazer um minicurso, com produtores de fora, para aprenderem técnicas no estúdio. Mas temos ótimos resultados aqui, como o Panzer, que em "Honor", fez uma produção animalesca com o Henrique Baboom. E ainda tem o HIBRIA que fez tudo de estúdio do "Silent Revenge" no Brasil, o Noturnall, que teve os próprios músicos na produção junto com o Russel Allen, o Dinahead com "Chordata II", o Seventh Seal, o último do Andralls... E ainda temos nomes emergentes de produtores como Felipe Eregion (que produziu o EP "Blessed by the Hands of Flames" do Vociferatus, os irmãos Pirozzi no PyroZ studio no RJ, o Luiz Freitag do AM Studio, o próprio Brendan Duffey que fez o Hevilan... Temos pessoas que estão fazendo a diferença aqui, logo, não perdemos para ninguém, só para o preconceito "o que é bom vem do exterior" que muitos ainda teimam em carregar... A qualidade tem melhorado ano após ano, lançamento após lançamento, mas lembremos também de respeitar aquilo que a banda quer de uma produção. E isso nem sempre é fácil para muitos aceitarem.

Marco Antonio Garcia e Jeff Walker, do Carcass

HMB: Como você se relaciona com a Internet, tanto no seu trabalho como na sua vida pessoal?
Marcos Garcia: Particularmente, acho a internet ótima, mas acho que por ser um pouco mais velho, sei impor limites a mim mesmo. Não uso os recursos de internet de celular, então, tenho uma vida fora do mundo virtual, que me toma mais de 80-85% de meu tempo. E por meio dela faço ótimas amizades, que acabo encontrando no mundo real.
O problema da internet é que ela acabou se tornando uma parte essencial da vida de pessoas que necessitam se expor a todos, um gigantesco reality show, onde nenhuma privacidade é respeitada. E isso não vai apenas da questão de opinião (basta postar algo de sua opinião, e lá vem as patrulhas do bom mocismo), mas canso de ver todos os dias as pessoas dizendo "vou dormir", "indo para a academia", "indo para a festa", sempre dando aberturas aos espertos que ficam em busca de vítimas. Já vi vários crimes onde, de certa forma, o Facebook foi a ferramenta do criminoso. É preciso impor limites a si mesmos.
E acho a net legal para a divulgação de trabalhos de bandas, é essencial. Agora, sou inimigo declarado de downloads ilegais de discos e DVDs, pois alguém investiu dinheiro para aquilo ser lançado. É uma questão de justiça. Baixou, ouviu e gostou? Pague pelo material físico, ou mesmo pelas versões digitais. Quem faz downloads ilegais e lota HDs com trabalhos autorais não disponibilizados gratuitamente, é um ladrão: está roubando a banda, as gravadoras, as lojas, a cena. E sem mimimi de cunho socialista, de querer dizer que as bandas agora possuem domínio de seu material! Isso enfraqueceu de tal forma as gravadoras que poucas são as que investem em discos novos. E vai chegar a um ponto no futuro que se as próprias bandas não terão dinheiro para investir. Ou seja, estão matando bandas como Sepultura, Sarcófago, Metallica, Slayer e outros, pois no início, nenhum deles tinha um centavo para investir gravações, prensagem e distribuição. Isso os socialistas da net não falam, não é? E ainda deixo claro que os garotos do Sepultura não tinham dinheiro nem para certas necessidades antes do sucesso lá fora. Se a Cogumelo não tivesse posto dinheiro deles na gravação dos primeiros discos, bem como a Roadrunner também fez, eles não seriam ninguém.
Alguém investiu, logo, trabalhou por isso. Pague esta pessoa por seu trabalho, oras... Se não quer, que vá para a P%$# que os P@$#@ e fique por lá. Não fará falta alguma...

HMB: Planos para o futuro?
Marcos Garcia: Muitos: Me tornar Doutor na minha área, e continuar o bom e velho Pai Marcão, sempre lutando pela unidade no Metal, na exposição do Metal como cultura e formador de opinião, bem como real movimento e patrimônio cultural do Brasil.
E continuar sempre sendo o cara que gosta de tirar fotos com bandas, colecionar palhetas e CDs, ter mais e mais amigos, e romper modelos de pensamento que já faliram.

HMB: Resuma Marcos Garcia em uma frase
Marcos Garcia: "Esqueça o passado, não se preocupe com o futuro, concentre-se apenas no futuro", de Buda, é a frase que melhor me define.

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Marcos Garcia: Ora, o prazer é todo meu, e agradeço demais pela oportunidade. Aos caríssimos leitores, deixo a mensagem: reclamar das coisas na cena é perda de tempo e energia. Abrace a causa, estude, cresça como ser humano. Compre revistas, CDs, camisetas, zines, leia boas referências em termos de música, vá aos shows, apoie sua cena local sem restrições.
O Metal nos une, então, nada nos separará. In Union We Stand.

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