sexta-feira, 25 de abril de 2014

Evandro Júnior, fôlego para continuar... Sempre!


As pessoas me perguntam: Você só entrevista bateristas??? Não! Claro que não. Entrevisto pessoas, entrevisto opiniões e acima de tudo, entrevisto quem tem algo para dizer. Agora, não tenho culpa se eles, lá de trás do seu praticável,  tem sempre muitas coisas, relevantes, diga-se, para falar.. E para não fugir da regra segue mais um baterista que tem muita experiência e melhor, muitas histórias para contar. Desta vez Evandro Júnior, confiram:

HM Breakdown: Antes de tudo, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, nos fale sobre você e suas atividades.
Evandro Júnior: Antes de tudo, obrigado pelo convite e boas energias para o HMB! Vou me apresentar e fazer um apanhado geral dessas três décadas que estou envolvido com a cena nacional.
Meu nome é Evandro Júnior e toco bateria desde os 17 anos. A vontade de tocar bateria e ter uma banda começou na verdade mais cedo, por volta dos 13/14 anos, mas esse desejo só se concretizou no dia em que meu pai percebendo minha paixão pelos tambores, chegou em casa um dia com uma bateria usada que ele comprou e me deu de presente. Jamais vou esquecer esse momento! A partir daí, nunca mais parei, e a paixão por esse instrumento me levou inclusive a trabalhar por uns doze anos no comércio de instrumentos musicais, especificamente a bateria. Voltando a 1984, eu e meus vizinhos de rua decidimos ter uma banda de Heavy Metal. Era uma época em que já éramos moleques cabeludos fãs de Maiden, Judas, Sabbath. Conseguimos alguns instrumentos precários, amplificadores e começamos a ensaiar no porão da casa do Henrique "Poço" que a principio queria tocar baixo, mas acabou optando por cantar. A banda passou a se chamar "Fúria", começamos a tocar covers e algum tempo depois passamos a compor as primeiras musicas, e realizamos nossa primeira apresentação ainda em 84. Já no ano seguinte ocorreram algumas mudanças na formação e resolvemos mudar o nome da banda para "Anthares", e foi aí que fomos infectados pelo vírus que vinha da Bay Area em San Francisco e se alastrou pelo mundo. Passamos a tocar Thrash Metal e começamos a fazer muitos shows, até assinarmos um contrato com o extinto selo Devil Discos para o lançamento do álbum "No Limite da Força" em 1987, que acabou se tornando um dos clássico do metal nacional. Foram anos grandiosos, de muitos shows históricos e muita loucura. O Anthares acabou passando por profundas mudanças já em 90, que quase levaram a banda ao fim, mas resistimos até 96 com outras formações. A partir daí a banda parou e eu fui tocar no Siegrid Ingrid, uma banda que estava bastante em evidencia na época. Fiz parte da formação do Siegrid Ingrid até o fim das atividades em 2003 e gravei o álbum "The Corpse Falls" em 99, lançado pelo selo Cogumelo Records. Após o fim do Siegrid, iniciamos um novo projeto chamado "Skinlepsy" e gravamos um demo tape que teve ótima repercussão na época, mas acabamos congelando o projeto por tempo indeterminado devido a mudanças repentinas logo no inicio e o desgaste que vivemos nos tempos loucos do Siegrid Ingrid. Eu acabei voltando para o Anthares em 2004 e a partir daí a banda nunca mais parou. Apenas algumas pausas curtas ocorreram, mas estamos na ativa a 10 anos e fazendo muitos shows pelo país desde então. Em 2011 finalmente retomei o Skinlepsy com o André Gubber (guitarrista), passamos a compor e em 2013 lançamos o álbum "Condemning the Empty Souls" pela Shinigami Records. E também faço parte da formação do Desaster, banda ícone do Thrash Metal nos anos 80, que também voltou a ativa em 2011, e em breve estará lançando seu EP de estreia intitulado "Face of Desaster".

HMB: Nos anos 80, em algum momento você imaginou a importância que o Anthrares teria e, principalmente, a importância que “No Limite da Força” teria no Heavy Metal Mundial?
Evandro: Realmente não, e hoje não sei dimensionar o grau de importância que o álbum tem tanto no Brasil quanto lá fora. Evidente que o Anthares continua fazendo muitos shows pelo país e isso se deve ao sucesso e reconhecimento que o álbum tem. Naquela época a banda já estava em evidencia pois, dividíamos os palcos com grandes nomes como o Sepultura, Korzus, Dorsal, Ratos de Porão, MX, Attomica. E devido a isso recebemos o convite de pelo menos três selos interessados em lançar o álbum de estreia da banda. Optamos pela Devil Discos, que bancou toda a produção. Já havia uma grande expectativa do publico pelo lançamento, mas a importância que o álbum ganhou ao longo dos anos definitivamente não era algo que a gente pudesse vislumbrar de uma forma realista.

HMB: Interessante notar que a banda se manteve ativa e relevante para a cena nacional, muito disso graças ao seu esforço em manter o nome da banda em evidência. O que o Anthares significa para você?
Evandro: Eu sempre achei que o Anthares merecia mais, que deveria ter gravado outros álbuns, aliás isto está para acontecer agora com o lançamento do novo álbum "O Caos da Razão" que está sendo gravado, 27 anos após o "No Limite da Força". Mas afinal, manter uma banda na ativa produzindo material, gravando álbuns, depende de todos os envolvidos, e eu nunca fui o "dono" da banda, nunca reivindiquei o poder de escolher quem deveria fazer parte ou não da formação, mas mesmo assim eu sempre batalhei para que a banda se mantivesse na ativa. Foram varias mudanças na formação e em todas elas a iniciativa de abandonar o barco partiu sempre dos outros. Após termos gravado um novo demo tape em 95 e eu ter feito um trabalho intenso de divulgação, percebia a falta de comprometimento dos outros, o desinteresse, e isso atingiu um ponto em que fui chegando a conclusão de que já não valia a pena. Então, da mesma forma que os outros saíram em momentos anteriores, eu decidi sair também, mas logo em seguida a banda encerrou suas atividades. Quando voltamos novamente em 2004, o astral era outro, era mais de confraternização, de voltar a fazer shows e curtir, mas na minha cabeça, a responsabilidade de se manter o Anthares na ativa sempre foi por buscar o lado mais profissional, a atitude que o publico espera de uma banda veterana na cena, fazer algo que as pessoas possam elogiar, respeitar, dar valor, e é isso o que temos buscado nos últimos anos.


HMB: Como é o trabalho com o Skinlepsy?
Evandro: É um aprendizado constante. No Skinlepsy nós temos maior liberdade de composição, e conseguimos criar usufruindo das nossas influências que são muitas, dentro das vertentes mais pesadas do metal. Na musica do Skinlepsy você consegue identificar elementos do Thrash, Death e Hardcore, desde suas raízes até as sonoridades atuais. A banda foi formada logo após o fim do Siegrid Ingrid em 2003 e seguimos o curso natural das composições. Não se tratava de um novo projeto musical com novas temáticas ou sonoridades diferentes, mas sim a continuidade do que era o Siegrid Ingrid. Se você escutar o álbum "The Corpse Falls" de 99, perceberá isso claramente. Nós estamos no momento em processo de novas composições que farão parte provavelmente de um EP que pretendemos lançar ainda em 2014. Também estamos começando a criar ideias para nosso primeiro clipe oficial, e muito provavelmente o Skinlepsy passará a ser um quarteto em breve. Isso trará uma dose extra de peso nos nossos shows e dará maior liberdade para o André Gubber, que além de ser o único guitarrista, ainda é o vocalista.

HMB: Tocando em três bandas, como você administra o seu tempo, e melhor, como administra cada particularidade dessas bandas na hora de compor?
Evandro: Eu passei a tocar com três bandas a partir de 2011, e de lá para cá, as coisas tem caminhado com alguma normalidade. Porém, percebo que agora em 2014 com o lançamento do álbum do Anthares e também o EP do Face of Desaster as coisas tendem a ficar bastante corridas, mas dá para administrar sem tanta interferência na vida pessoal. A questão é que cada vez mais meus finais de semana estão sendo reservados para shows. O Anthares tem cinco datas confirmadas até Agosto, e o Skinlepsy também. Evidente que as datas não podem coincidir, então tudo é planejado de acordo com a minha agenda. As bandas bandas tem suas próprias agendas e nelas anotamos todos os shows que vão sendo confirmados para que não haja problemas. Já o Face of Desaster ainda não voltou aos ensaios, pois a banda vem se dedicando única e exclusivamente a finalização e lançamento do EP, o que deve acontecer em breve, e eu ainda não sei exatamente o que esperar desta banda. Se as coisas tomarem a mesma intensidade que está ocorrendo com o Anthares e o Skinlepsy, minha vida vai virar uma loucura e eu teria que dedicar meu tempo a musica. O problema é que o retorno financeiro, como todo mundo sabe, é extremamente pequeno, então pode até acontecer de eu ter que abrir mão de uma dessas bandas para dar conta do recado. Sobre a questão da composição, não vejo tanta dificuldade, porque no fundo, as três bandas tem diretrizes em comum que é o Thrash Metal. A exceção do Skinlepsy que tem maior diversidade musical e faz com que eu tenha de utilizar elementos do Death e do Hardcore e outras levadas mais complexas que exigem mais de mim, mas como eu escuto bandas dos mais variados estilos, então, nada chega a ser tão estranho para mim na hora de compor. O Anthares e o Face of Desaster são bandas de Thrash Metal, e isso eu toco desde moleque, acho que já estou familiarizado com o estilo.

HMB: E sendo bandas que tocam com velocidade, como você lida com o desgaste e cansaço do corpo? Faz algum tipo de preparo físico ou até mesmo alguma alimentação especial?
Evandro: Olha, eu acho que condicionamento físico para um baterista de metal tem sua importância sim, e te digo isso por experiência própria. Eu levava uma vida sedentária até os 30 anos, e tinha algumas dificuldades para tocar nos shows, o corpo todo sentia. Lembro que alguns shows eu fazia um esforço supremo para terminar, e quando acabava eu precisava deitar para respirar direito. Comecei a fazer musculação a partir daí, não só por causa da bateria, evidente, mas porque eu me sentia cansado mesmo, fora de forma e fumava quase dois maços de cigarros por dia. Passei a me dedicar nos treinamentos como se fosse minha única chance de vida (risos), mas algum tempo depois, percebi que estava com uma pegada melhor na batera, pernas e braços respondiam bem e o folego havia melhorado bastante. Mas é bom que se diga: o segredo do baterista está nos dedos, nos punhos, nos calcanhares, na técnica! Condicionamento ajuda, mas é a técnica quem manda. Portanto, se você quer ser um bom baterista, estude, e bastante, tenha paciência e perseverança, senão você vai ser só um tocador de bateria como eu (risos). Já a alimentação eu confesso que desde que me conheço por gente como porcaria e continuo comendo. Mas isso tem se tornado cada vez mais uma, preocupação para mim, preciso urgentemente de uma reeducação alimentar, e certamente isso também vai me ajudar bastante a tocar com mais qualidade, força e resistência.

HMB: Você se preocupa também com o condicionamento psicológico, afinal, uma mente cansada reage de forma mais lenta?
Evandro: Cara, como isso é importante! É uma coisa que me preocupa demais, preocupa a todos nós. Mas manter a mente concentrada, focada num objetivo que a gente almeja alcançar, num desejo profundo de corpo e alma, acredito que seja o grande segredo da felicidade, e todos nós podemos alcançar nossos objetivos, não importa qual seja o tamanho dos obstáculos, das dificuldades. Em 2011, quando resolvi encarar o trabalho árduo de tocar com três bandas, eu estava vivendo o pior momento da minha vida, devido a um relacionamento muito infeliz e que havia chegado ao fim. Eu perdi o rumo da vida, quis abandonar tudo e estava enlouquecendo, mas em meio ao caos mental, eu senti o milagre da música, o quanto tocar e tocar ia curando aos poucos minhas feridas e então decidi não parar mais. Coloquei um objetivo na cabeça: eu tinha que gravar três álbuns, um com cada banda, e não importava mais nada. Estou muito próximo de atingir esse objetivo agora em 2014. E já estou criando mentalmente planos para dar sequência, criar novas metas. Na sua pergunta você se refere ao condicionamento psicológico, e acho que tudo se resume AO FOCO. Sua mente pode estar cansada, seu corpo pode te deixar exausto, mas mantenha o foco e seja feliz. Como diz o ditado: mente vazia, oficina do diabo!

HMB: Qual a sua concepção para a gravação das suas partes de bateria? Existe algum “segredo” que você poderia compartilhar conosco?
Evandro: Gravar para mim sempre foi algo extremamente prazeroso e ao mesmo tempo estressante! São duas sensações completamente opostas que você vivencia dentro de um estúdio de gravação. Eu faço tudo o que é possível para me manter relaxado na hora de gravar, tomo uma cerveja sempre, pois ela reduz a adrenalina, e faço os aquecimentos normais que qualquer baterista faz, alongamentos e variações de stick control na borracha. Mas mesmo assim, na hora do "1, 2, 3 gravando" é difícil controlar a tensão. Eu também costumo improvisar algum groove durante alguns minutos, usando todas as peças da batera, pelo menos uns 10 minutos e aí vou para a gravação. Tenho extrema dificuldade em ouvir o metrônomo, então apesar disso atrapalhar o andamento, eu nunca gravei com metrônomo. Como eu pratiquei rudimentos com metrônomo durante anos, consigo manter um beat com alguma consistência. Também não gosto de "emendar" a bateria nas gravações, então tento gravar as musicas de cabo a rabo, sem parar. Acho isso muito difícil, exige muito da mente e corpo, mas até hoje ainda não encontrei a fórmula ideal para ter uma grande performance na hora da gravação. Como eu não sou nenhum músico profissional que vive e respira dentro de estúdios de gravação e faz o seu trabalho com relativa tranquilidade, eu procuro encontrar mais tempo para praticar e tocar quando uma das bandas resolve ir para um estúdio gravar material novo.


HMB: Planos para o futuro?
Evandro: Vamos falar de planos futuros especificamente pelo lado musical que é o que interessa nesta conversa, e nos dias atuais é o que mais me interessa também, mesmo porque pelo lado pessoal eu ainda estou em fase de reformas estruturais. Como te falei anteriormente, eu tinha um projeto em mente, o de gravar três álbuns com as bandas que eu faço parte e isso está muito próximo de se concretizar.
O Skinlepsy, que lançou seu álbum de estreia em 2013, e felizmente recebeu somente críticas positivas e que nos motivou, possivelmente terá mais um guitarrista na formação, ideia que partiu do próprio André Gubber (guitarrista/vocalista), para que a banda ganhe uma consistência maior e mais peso nos shows. Acredito que em breve anunciaremos o novo membro da banda, e a partir daí nós gravaremos nosso primeiro clipe oficial, terminaremos algumas musicas que estão em fase inicial neste momento - apesar de já termos três musicas prontas - e entraremos em estúdio antes do fim do ano para gravarmos possivelmente um EP. Estamos buscando parcerias no exterior para futuras distribuições dos nossos trabalhos por todo o mundo e estamos começando a agendar muitos shows.
O Anthares deve continuar realizando muitos shows nos próximos anos, como sempre aconteceu ao longo desses quase trinta anos de banda. Acredito que com o lançamento do novo álbum "O Caos da Razão" que acontecerá neste ano, a quantidade de shows deve dobrar. Também está nos planos da banda a gravação de um clipe oficial, a ser lançado simultaneamente ao álbum.
E o Desaster, ou Face of Desaster se você preferir, acabou de terminar a mixagem do seu EP de estreia. Neste momento, as sete musicas que compõem o EP estão sendo masterizadas e em breve teremos novidades. A arte gráfica deverá ser apresentada nas próximas semanas e há planos para um clipe oficial também. O Desaster foi uma banda importante da cena nacional nos anos 80, mas que nunca gravou um registro oficial. Quando voltaram a ativa em 2011 eu me ofereci para ser o baterista, e após alguns shows em 2012 e algumas mudanças na formação, a banda entrou em estúdio e desde então se dedicou única e exclusivamente as gravações. A expectativa é de que a banda volte aos ensaios e passe a realizar shows em 2014.

HMB: Resuma Evandro Júnior em uma frase.
Evandro: Persistente naquilo que acredita, um perfeito idiota naquilo que não acredita, um apaixonado pela bateria e pelo heavy metal, um perturbado diante da incompreensão da vida, e da própria raça humana.

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Evandro: Quem agradece sou eu pelo espaço e pelo convite, a você meu camarada, que segue uma trilha muito similar a minha e certamente compreendeu muito bem tudo o que falei nesta conversa, e estendo meu agradecimento a todos que porventura tenham lido estas linhas, afinal se tiveram o trabalho de lê-las é porque compartilham de ideias e ideais similares, ou seja, somos todos amantes da música pesada! Um viva ao metal nacional, a nossa cena que se mantem ativa desde os anos 80, revitalizada por bandas extremamente competentes, e gente como você e tantos outros que dedicam muito do seu tempo a divulgação da cena, que organizam eventos, que editam revistas, que montam fans pages, que mantem programas de radio, de tv, selos independentes, meu mais profundo respeito e admiração a todos vocês!

Um comentário:

  1. Bem, sou suspeita pra falar desse cara. Ele é o grande culpado por eu curtir metal. Afinal, quando eu tinha uns quinze anos, ouvi AC/CD pela primeira vez ao lado dele, meu primo Evandro Junior. Meu, fiquei de queixo caído. Ahhhhhhhhhhhh!!! kkkkkkkkk Adorei! Resultado...nunca mais parei de ouvir. Grande baterista, pra mim,está entre os melhores. Grande entrevista. Parabéns! Você merece todo o sucesso do mundo, pela sua garra e competência!

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