quarta-feira, 9 de abril de 2014

Panda Reis, sem medir palavras!!!


Panda Reis pode ser considerado um ícone da música extrema brasileira, isso não quer dizer que o caminho até ai foi fácil! Além de ser um dos músicos mais atuantes e “ocupados” da cena nacional, ele tem muito a dizer e diz, sem medir palavras. Confira!!!

HM Breakdown: Antes de qualquer coisa, fale sobre você, suas atividades e em como você se tornou baterista.
Panda Reis: Sou um afrodescendente nascido na capital de São Paulo, mais precisamente na Vila Campestre, bairro violento e dominado pelo P.C.C., onde existem duas leis e dois idiomas (Português e o dialeto da periferia). Filho de mineiros que sofreram demais pra criar quatro filhos. Sou bacharel em História e atuante no movimento anticapitalista, escrevo artigos, textos em vários meios alternativos, alguns deles eu assino, outros uso outro nome, e tenho rascunhados dois livros que talvez um dia eu lance, talvez nunca os lance, mas serão concluídos. A política me fascina pela maneira como ela pode maquiar o que está claro no sistema, e mesmo assim legitima o ilegítimo.
Sobre como comecei a tocar bateria, é uma história relativamente curta e simples. Quando eu e o Cleyton Ishini resolvemos montar uma banda (ao contrário do que todos pensam, o Alex Chiovitti chegou quando a banda já estava formada e já tinha até o nome que tem hoje), estávamos sentados na calçada em frente a minha casa tomando pinga com limão. Comecei tocando baixo, mas não demorou muito para todos perceberem (isso me inclui), que era inviável que eu tocasse aquele instrumento, era muito ruim! Nessa época, meu irmão, que estava tocando bateria com a gente, saiu fora e eu, que automaticamente fui empurrado para a bateria, aceitei prontamente por gostar do som do instrumento, mas não fui eu que a escolhi.

HMB: Em todos esses anos tocando, não só Death Metal, mas os mais diversos estilos, o que você acredita que, como músico, tenha afetado a sua forma de ver a vida?
Panda: Foda, não me considero músico, saca? Como eu sempre digo, acho que a música é um álibi para as minhas letras. Sou batuqueiro e não um baterista (risos)! Mas é inegável que, depois de mais de duas décadas, eu tenha assimilado e aprendido muito com a estrada, com as pessoas, com a hipocrisia de muitos que passaram pela minha vida e de muitos que ainda tentam permanecer por perto (nem sei o porquê). Aprendi que cada ser humano é muito parecido, não fisicamente, mas somos tão doutrinados a sermos lineares, que nos tornamos uma espécie homogênea na maneira de pensar e levar a vida, alguns conseguem ser heterogêneos e se libertar do alinhamento cultural que temos aqui no Ocidente, alinhamento esse que se subdivide entre primeiro e terceiro mundo, para deixar claro quem manda nessa hierarquia que chamam de civilização. Tanto faz ser um playboy bombadinho do Jardins ou um Headbanger do ABC, somos muito homofóbicos, sexistas demais, ocidentais demais. Claro que não vou generalizar, mas depois que a tecnologia colocou todos muito mais “próximos”, as máscaras estão caindo, as redes sociais estão revelando fascistas, racistas, homofóbicos, xenofóbicos que estavam escondidos sobre suas jaquetas de couro e patchs de bandas de metal e punk. Antes achava que o povo do underground era diferenciado de tudo isso, hoje percebo que nem é bem assim.
E o lance de tocar em várias bandas e projetos de estilos diferentes me fez entrar em contato com gente diferente e perceber que são todos iguais ou no mínimo muito parecidos. Os padrões capitalistas estão em todos os lugares e estilos.

HMB: Então podemos dizer que muitos usam de determinado estilo de vida apenas para maquiar um ódio cultivado? Ou se valem disso para por pra fora esse sentimento?
Panda: Em alguns casos o ódio cultivado é o que transforma o estilo de vida de alguns. É complicado canalizar tantos sentimentos e transformá-los em uma existência frutífera, pois sentimento mais puro e mais sincero que o ódio não existe. Esse sentimento moldou muito mais o mundo, transformou a nossa civilização e modificou a história do ser humano do que as mudanças ocorridas por influência do amor. Não costumo desacreditar de quem sente ódio, mas nenhum amor humano me tira o ceticismo, o amor é temporal e mutante, o ódio não.
Alguns conseguem maquiar seu ódio, seu sentimento, vivendo um estilo de vida em que o ódio esta presente e é visto de uma maneira mais aceitável (no underground se aceita um disco com o singelo nome "Destilando o Ódio”, em qualquer outro estilo de vida isso seria bem criticado) e se acham, podem vomitar e exorcizar seus sentimentos, a maioria o faz sem notar, sem perceber, mas o fazem.
Acredito que estilos de vida que equalizam esse sentimento e não o negam, não fingem que ele coexiste dentro de você, são mais bem sucedidos em suas relações mundanas, pois negar o maior sentimento humano traz sérios problemas pra mente.
Então podemos dizer que alguns sentem tanto ódio que tendem a seguir grupos sociais, estilos musicais ou qualquer outro grupo ou estilo, seja musical, teatral, artes em geral, sem nem mesmo se dar muita conta disso. Outros procuram grupos extremistas e que levam a bandeira do ódio aliado a outras ideologias, para expurgar seu ódio sem ser recriminado ou excluído da sociedade. 
Ódio e amor são muito parecidos e extremos, muitos sentem amor e acham que é ódio, rsrs.



HMB: Mas você não acha que é muito fácil confundir ideologia com ódio? Ou melhor, podemos dizer que odiamos alguém, mas só não concordamos com a forma dele se expressar? Não seria o ódio a consequência das atitudes irresponsáveis de alguns?
Panda: Claro que sim. Acontece o tempo todo, em grande e pequena escala, no micro e no macro. O humano comum não consegue nem diferenciar amor de sexo, carinho sensual de sentimento fraternal, como não querer que não confundam ódio de diferentes ideologias? Sejam elas quais forem. A maioria das pessoas tem até um entendimento errôneo do que é ideologia. A construção de algumas ideologias vira ordem, vira Estado.  E não seria irresponsável julgar algo irresponsável?  É julgamento!  Julgado pelas suas ideologias. Tudo merda (burocracias ideológicas) de Sapiens que tentamos organizar e desorganizar do que é viver em sociedade, seja ela capitalista ou pseudocomunista.

HMB: Como músico de estilo extremo, você concorda que quanto mais o ser humano erra, mais a gente tem bala na agulha para desenvolver temas e letras?
Panda: Estando aqui abaixo da linha do Equador, não falta bala na agulha para quem escreve sobre temas político sociais, por esse motivo acho estranho ver bandas falando e escrevendo de mitologias e misticismo, estranho mais ainda quando esses mitos e misticismo são importados da Escandinávia ou similares. Mas isso é um modo de pensar particular, pois cada músico deixa suas ideias fluírem, suas imaginações e idealismo, mesmo que fictícios. Mas é inegável que aqui no Brasil temos inspirações para letras e música todos os dias, basta lermos os jornais e vermos o que de novo está acontecendo, e estou falando do presente, se voltarmos a momentos históricos anteriores, o leque fica maior.
Porém apesar da infinita fonte de inspiração, corroboro com o Eduardo, do Facção Central. Preferia estar falando das flores, do amor, mas enquanto o sistema e o Estado oprimirem e explorarem, o ódio ainda é minha maior forma de expressão e inspiração.

HMB: Como você vê a cena da música pesada nacional?
Panda: A música, como qualquer ação humana, está ligada à situação política e social do país, e isso vai mais profundamente além, pois até as mentalidades dominantes no mundo atual, contaminam e influenciam muito a música em geral, pois em um sistema capitalista não se pode esperar outra coisa a não ser que todos os tentáculos desse sistema abracem todas as esferas sociais de um país, sendo assim não estamos imunes a isso também, alguns mais outros menos.  Já falei muito sobre nossa cena estar prostituta e generalizada de uma maneira esquizofrênica de copiar o mainstreem, cria um pseudo mundinho, copiando falácias inventadas por uma burguesia mimada que "inventou" um modelo de revista, de mídia, de toda uma função capitalista de mercado que nos afasta da real arte e do verdadeiro propósito que ao menos nós temos (e todas as bandas do underground deveriam ter). Estereótipos que tentam enquadrar a todos. Mas, porra! Está tudo falido, tudo quebrado e decadente! As revistas, as gravadoras e a maioria das bandas novas são todas plástico. Claro que a saída está no meio de toda essa suruba, tem que saber separar, viu?  Porque para uma coisa essas merdas de redes sociais serviram, desmascarar um monte de fascistas, homofóbicos, racistas, neonazistas e até as viúvas da ditadura deram a cara! Estou adorando esse "novo mundo". Ninguém mais precisa deles, e mesmo assim a arrogância dos donos do underground insiste em não querer largar o osso. Sua arte fica quando você apodrece, então se não há nada útil pra falar e acrescentar, melhor sair fora.

HMB: Donos do underground é bem a definição! Porém, você com a Oligarquia, o Cambones e demais outras bandas em que toca, fazem shows regularmente, como são feitos esses convites e o que você leva em consideração ao aceitá-los?
Panda: Acredito que o legal de se ter uma banda seja tocar, viajar, conhecer pessoas e poder passar suas ideias para mais pessoas que tem ideias parecidas ou ao menos alguma simpatia com elas, pra mim, tocar é o propósito final de chatas horas de ensaios, chatas horas de sessões de gravações, reuniões e convivência humana, que por mais amistosa e sincera que ela seja pra mim sempre é muito difícil lidar com humanos, conversar, se relacionar, enfim, estar com outro ser humano, na maioria das vezes é bem difícil pra mim, mas aguento tudo isso por aquele momento de estar em cima (ou no chão mesmo) de um palco. Por isso não temos muita frescura na questão shows, se nos chamarem, e forem bandas e amigos, aceitamos na hora, nem perguntamos sobre grana e aparelhagem. Só costumamos pensar nisso depois. Hahahaha!!!  Se não conhecemos a pessoa ou é em outra cidade, somos sinceros e anticapitalistas, ou seja, nada de cachê (de que adianta lutar pra destruir algo se você com sua banda reproduzem o mesmo sistema?). Pedimos apenas que paguem as passagens para chegarmos à cidade e alguma coisa pra comer, do mesmo jeito que fazíamos há 22 anos.



HMB: O fato de ter esse lado antissocial te levou a ser baterista? Por que é difícil para você se relacionar com pessoas?
Panda: Eu não diria antissocial patologicamente falando, mas sim antirregras e vícios sociais que se repetem por gerações sem ao menos se darem conta de que estão repetindo idiotices temporais, sem se darem conta de que vivem de maneiras sistematicamente direcionadas, me enoja falar com a maioria das pessoas.

HMB: Sei que você participa de um projeto que ensina bateria para crianças carentes, então como você encara a falta de ensino musical nas escolas públicas?
Panda: Não faço mais parte desse projeto. Os traficantes e líderes do “Poder Paralelo” se incomodaram, porque eu não estava apenas falando de notas musicais. Agora estou tentando implantar um projeto de ministrar aulas de história na periferia, mas já estou encontrando obstáculos.  ONGs estão ligadas ao cordão umbilical do sistema, e o controle delas (da grande maioria) sempre vai ser da situação.
Ensino musical nas escolas públicas?  Não estamos dando conta nem do trivial, do fundamental!  Eles discutem em voltar com o ensino religioso, percebam que o controle do corpo e pensamento é o que interessa você acha mesmo que iriam colocar algo que faça seu filho pensar em uma escola pública? Se nem as matérias tradicionais são ministradas pra dar autonomia intelectual para o aluno!  Modelos estabelecidos!  A escola pública é uma fábrica que produz homens e mulheres que sirvam fervorosamente ao Estado, e ainda se sintam orgulhosos e realizados por isso.  Sou a favor do fim da educação tradicional e da implantação da educação libertária.
Não fui pra bateria para ser o isolado e o menos conhecido, não foi isso, mas pensando assim, talvez subconscientemente tenha sido. Hahahaha!!!



HMB: Planos para o futuro?
Panda: Conseguir terminar essa entrevista sem ter feito novos desafetos. rs

HMB: Resuma Panda Reis em uma frase.
Panda: “mais raiva do que medo..."

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.

Panda: Agradeço pela entrevista inteligente que me proporcionou! Queria que a molecada se ligasse que o mundo é uma farsa, uma falácia, uma alucinação ideológica tão bem construída que nos faz acreditar que um papel com números tem mais valor que carne e osso. Percebam que o mundo que vocês vivem pode sim ser mudado ao avesso. Mas só se vocês, jovens, quiserem e usarem as armas certas, esqueçam o que esses merdas formadores de opiniões tentam te empurrar goela abaixo, estude , lute! E, por favor bandas , vamos falar de coisas que possam fazer a diferença para quem escuta.

5 comentários:

  1. É isso ai Panda sempre mostrando para as pessoas que aquele que fede mais não cheira bem e aqueles que se julga a nata que se cuidem
    / Rapper´s da vila campestre .....

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  2. O mano dá hora em / vc sempre mostrando para os donos da verdade que quem fedi mais não xera bem / Rapper´s da vila campestre





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  3. Sou fã mesmo!!!!
    E doida por esse cara!!!
    Eu sou testemunha do começo de tudo e sei exatamente a batalha e dedicação desse cara!!!!!
    O MELHOR BATERISTA DO MUNDO!!!!!!
    Panda Reis, você é FODA!!!!

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  4. Não só isso Claudia, um ser humano sensacional e uma alma impar em nossas vidas.. Mas disso vc tb sabe!!!! :)

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