quinta-feira, 5 de junho de 2014

Michele Dupont, somos personagens fúteis e altamente desprezíveis



Michele Dupont, radialista, modelo, escritora e Metalhead! Um mistura explosiva e nutrida de muita capacidade, bom senso e determinação. Além de personalidade forte e intuitiva. Não se esquiva nem dos assuntos mais delicados e mostra que sabe exatamente aonde quer chegar. Confira!

HM Breakdown: Olá Michele, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Faça um resumo de você e de suas atividades.
Michele Dupont: Resumo de mim mesma, a saga sem fundamento (risos)... Vamos lá.
Meu nome é Michele Dupont, aonde abreviei meu nome e sou conhecida como Mi Du. Morei algum tempo fora do Brasil e quando voltei, comecei a dar sequência a um blog com o intuito de divulgar bandas nacionais, no começo foram apoio as bandas de Doom Metal, que infelizmente ainda não tem o apoio de produtores e de zines, e acaba sendo um público muito seletivo. Temos blogs e sites somente voltados ao Doom, mas é muito pouco perante a cena nacional. Podemos perceber começando por coletâneas, temos muita pouca coisa, existe um projeto comandado pela Ellen da Sunset que reuniu várias bandas de Doom e foi feita uma coletânea. Também a Last Time do Rafael Sade, tecladista da Helllight , tem dado motivação a cena Doom com eventos voltados ao estilo. Não poderia deixar de citar também as bandas Bullet Course (Curitiba) e Souls Silence (São Paulo), e a Volkmort de Santa Catarina. Mythological Cold Towers , na minha opinião é uma das bandas que mais se destaca nesse meio. Se formos citar todas as bandas de Doom que apoio e pessoalmente aprecio o som, terei que escrever um livro.
Outra vertente que apoio e amo é o Death Metal e o Black Metal. Gosto em especial de bandas que misturam ambos os estilos. Algumas inclusive polêmicas como no caso do Goatpenis e Murder Rape. Mas acho que quando abraçamos a causa do Underground, temos que primeiro ter a coragem de assumir nosso lugar no meio de tudo isso, bem como termos atitudes que futuramente irão refletir na cena.
E gostaria de falar de algumas em especial, que estão fazendo um trabalho excelente e algumas, bem inovador, como o Trator BR, South Legion, Skinlepsy, Hibria e claro o Distraught e a Rhestus Heavy Metal. Jamais poderia deixar de falar da Profane Souls, banda que representa o Black Metal Old School com excelência e tem se destacado inclusive em cenas que não são necessariamente a BM. Outra banda que estou ansiosa para o novo trabalho é a Division Hell, banda de Death Metal. Bacana também foi ver bandas como Necrotério Death Grind e outras voltarem a ativa. Bandas que realmente fazem a diferença com estilos próprios: Zombie Cookbook e Whipstriker. Pegando esse gancho, tenho que falar do trabalho solo do Power from Hell do Aron Romero.
Sempre que vou para algum evento, quando as bandas sobem ao palco, tenho o seguinte pensamento "me surpreendam". Acho que todos os entusiastas do Underground tem esse pensamento, e é algo daquilo que necessitamos para continuar. Me desculpem se esqueci de citar bandas, mas precisaria de uma parte 2 nessa entrevista.

HMB: Como é o cenário da música pesada na sua cidade?
Michele: Na minha cidade, que é Curitiba, tem crescido muito de um ano até hoje, bandas curitibanas como a Imperious Malevolence é referência em Death Metal curitibano, assim como bandas antigas e que ainda estão na ativa como o Amen Corner, Doomsday Ceremony, Profane Souls, Scorner, Offal, Terrorzone, e claro a banda mais foda da cidade, a Dalborga! Mas não podemos deixar de citar pessoas que são de extrema importância na cena como o Beto Toleto, da 91 Rock e promotor de eventos, Hamilcar da Damar Produções que tem feitos excelentes fests e trazido muita banda foda de fora, ambos fazendo a cena curitibana voltar a sair do limbo e tornar-se novamente um polo do Underground. Atualmente moro em Blumenau, tem bandas excelentes como a Goatpenis, mas a cena aqui está mais nos grandes festivais como no Curupira, River Rock, Zoombie, e claro agora com o Armagedon que aconteceu a pouco tempo.


HMB: E seu trabalho na Dark Radio Brasil?
Michele: Meu trabalho na Dark Radio se resume a tudo o que amo, poder colaborar indiretamente ou diretamente com as bandas nacionais autorais, expôr minhas ideias e meus conceitos, dar espaço a mulher dentro da cena Underground. A princípio a ideia toda era fazer um programa mais descontraído, porém foi efetivo que as pessoas preferem mais ouvir os sons que rolam do que as besteiras que falávamos, também havia a questão que era eu e a minha irmã a Sil que apresentávamos o programa, então acontecia um mix de estilos, a Sil teve seu próprio espaço, e confesso que ela está se saindo soberbamente bem! Que orgulho!!!
Eu só tenho a agradecer ao Daniel Agehost e ao Baron pela oportunidade de poder aprender tanto sobre o Underground com esses dois "Monstros de sabedoria METAL" (mereço um aumento depois dessa hein), mas honestamente falando não recebemos nada financeiramente, é o verdadeiro espírito de luta do Underground que nos mantém unidos. E toda família DARK RADIO. Em especial a Rose, nossa salvadora que sempre fez com muito carinho a edição de nossos programas.

HMB: O rádio exerce um fascínio em quem trabalha com ele, como você vê a crescente onda de web rádios na Internet?
Michele: Meu primeiro contato com webradio aconteceu no Japão, pois não me adaptava as rádios locais e na Internet havia vários canais com os estilos de minha preferência. A própria 91 Rock, aderiu a essa onda crescente. Por exemplo, eu usava no meu carro o celular acoplado ao som, então conectava á internet e acessava o link da webradio. Acredito que futuramente as ondas da rádio serão as rádios onlines.

HMB: E você também trabalha como modelo, como é esse trabalho?
Michele: Pois é, é um trabalho que meio narcisista eu confesso, mas quem não conhece minha história acaba achando que faço para chamar atenção ou coisas do gênero. A princípio começou como uma terapia. Fui casada por dez anos, e meu ex nunca me disse um elogio, muito pelo contrário, sempre dizendo que eu estava velha e feia, então comecei a me cuidar e tirar fotos. Mostrei para algumas pessoas e me disseram sobre os trabalhos de altmodel, porque eu adoro misturar personagens as minhas fotos, algo mais teatral. Gostei e comecei a fazer ensaios mais profissionais. Fui convidada pela Naty Vamp, uma grande entusiasta da cena Gótica Nacional, para representar a sua loja, a Góticas Famosas. Disso surgiu uma grande amizade e pude também mostrar meus trabalhos atingindo mais pessoas. O outro lado é mostrar que a sensualidade faz parte do Undergorund, assim como a subcultura gótica e o BDSM.

HMB: Então você se reinventou? Como foi para você descobrir que as pessoas se interessavam por suas fotos e por seu trabalho como modelo?
Michele: Cresci na década de 80. Anos 90 as modelos eram padrão "barbie" só que sem os peitos. Lembro que sofria muito em relação ao meu corpo, e ainda sofro, pois fujo do padrão brasileiro de mulher com corpo de violão, bunda grande e tal. Ainda tenho muito receio com minhas fotos, no quesito pessoal mesmo, não faço para agradar ninguém, eu faço porque gosto. Resolvi fazer o trabalho mais artístico, levado para o lado sensual, incorporar diversos personagens. Gosto de exibir minhas tatuagens, e percebi que as pessoas conseguem ver que o trabalho é relacionado ao artístico, hoje tão em destaque como o das altmodels, que fogem de todos os padrões das modelos da indústria fotográfica usual. Eu acho lindo, tenho contato com várias, em especial algumas internacionais, que também fazem trabalhos voltados ao Underground. Descobrir que as pessoas gostavam foi natural, não estava esperando por isso. Mas confesso que desagradou muitas pessoas, que tinham convívio comigo, aquele pensamento retrógrado e hipócrita que , estava "queimando minha imagem". Bem, no início tive depressão, mas dai cai na real e comecei a me tornar ainda mais ousada. Pretendo fazer trabalhos mais levados ao BDSM e ainda mais obscuros.


HMB: E sendo o brasileiro machista, sexista e predominantemente covarde, você já deve ter sido atacada anonimamente pela Internet, como você lida com isso e como você faz para divulgar o seu trabalho?
Michele: Por incrível que pareça, fui atacada sim, mas por mulheres. Feminazis, algumas que eu conhecia e algumas anônimas que sei que são mulheres. Existe uma peculiaridade muito sutil, quando homens escrevem e mulheres. Eu tinha o ASK, mas acabei deletando, porque não me agregava em nada. E a maioria dos homens, mesmo não dando "like" nas fotos para evitar problemas, ou o que quer que seja, mandam inbox bem elegantes, elogiando o trabalho, em momento algum foram grosseiros.

HMB: Você não sente medo de lidar com o comportamento sexual humano?
Michele: Não. O que é mais natural que a sexualidade? Não é a forma que temos de perpetuar nossa espécie? O problema real seria o "mau comportamento", como temos visto, tão banalizados em nossa cultura. Infelizmente atingindo crianças e adolescentes que ainda não tem capacidade de poder discernir o que é correto do errado, coisas que deveriam ser passadas por nossos educadores e família. Tornou-se vulgar, o sexo, dentro dos bailes funks e a TV podre brasileira. Tudo moralmente confuso. O que é moral? Para mim, é ter maturidade de assumir o que deseja e ter capacidade de arcar com todas suas consequências.


HMB: Você concorda que o ensino sexual nas escolas públicas, abrangendo a sexualidade e também o respeito pela outra pessoa, seria importante para o desenvolvimento e o crescimento sadio do individuo?
Michele: Seria! Se tivesse sido implantado na década passada. Sem pessimismo, mas é o que a realidade tem nos mostrado. Desenvolvimento sadio, somente voltando as origens, resgate de valores do ser "ser humano". E o principal, a criação pelos pais, família, valores que tem se perdido. Geração perdida, essa atual.

HBM: E como você vê a banalização da sensualidade humana? E mais,como você lida com os assédios mais diretos?
Michele: Bem, a começar por alguns perfis na rede social. O sensual virou algo vulgar, hoje meninas que mal estão com o corpo formado se exibem para as câmeras e adoram, quando um homem as chama de gostosas. As próprias mulheres permitiram isso, por isso sou contra essas manifestações hipócritas feministas. As mulheres tem o que merecem.
Por incrível que pareça, nem inbox nem pessoalmente eu tive assédio direto, sempre que foram mandados inbox foram de elogios bem sutis até, acho que isso demonstra que existe respeito, principalmente na cena Underground, o que me deixa muito feliz com o rumo que estamos tomando. É inegável o fato que a cena está se fortalecendo, que estamos nos unindo.

HMB: O que você acha de grades eventos com o Erotica Fair?
Michele: Acho bem importante, até fui convidada, mas tempo é realmente meu problema no momento. Não fui pessoalmente, mas o trabalho que Xplastic tem feito é bem bacana, inclusive faço parte da rede da Xplastic. Quem sabe em breve terei fotos lá?

HMB: Você já pensou em fazer uma exposição com suas fotos?
Michele: Exposição? Não acho que é para tanto, mas gostaria de fazer um nu artístico em black and white, talvez ficasse bacana em uma exposição.

HMB: Poxa, Preto e branco ficaria ótimo. Você acompanha esse boom da literatura erótica? Qual a sua visão dessa busca por este tipo de literatura?
Michele: Sinceramente não. Eu prefiro literatura baseada na história e nas guerras, amo livros de suspense e ficção. Acho que é tudo momento, assim como foi o boom de literatura vampiresca. Logo passa.

HMB: E quais são seus autores ou livros preferidos?
Michele: Meu autor favorito é o brasileiro André Vianco. Li todos seus livros. Outro que cresci lendo foi S. King, e meu livro favorito de todos é Saco de Ossos. Existem outros que li e gosto muito, mas são coisas pessoais demais até para mim mesma, livros que ainda tenho muito a ler.


HMB: E musicalmente falando, você prefere quando as bandas abortam que tipo de temas em suas letras?
Michele: Tem as bandas que eu gosto. Bem, meu lado Doom não nega, temas ligados ao sofrimento, ocultismo e atualmente o que mais tem me balançado foi o tema de fim dos tempos, atualidades e guerra. Ando em uma fase em que perdi toda esperança na humanidade. Os humanos se tornaram fúteis e desprezíveis, e a cada dia andam com os olhos vendados para o fim, assim como a religião cega, o conformismo e a vitimização da sociedade nos tornou zumbis, sem cérebros. Gosto de músicas que abordam tudo isso.

HMB: E a que você acha que se deve essa futilidade da humanidade?
Michele: Antigamente isso me irritava, hoje eu entendo que precisamos de pessoas fúteis para nos dar valor. Essa futilidade se derivou da acomodação das novas gerações! Ninguém se importa com a roubalheira dos políticos, tudo é de fácil acesso hoje em dia, na real o mundo do brasileiro é pacato demais, isso torna as pessoas cada vez mais "moles". Teve essa "mexida" com alguns movimentos no Brasil, mas foi fraco, desonesto. O que realmente ocorreu é que, evoluímos a ponto de não precisar de mais ninguém. Vivemos vidas rotineiras, trabalhamos, estudamos... As a nossa maneira de se comunicar com as pessoas se tornou algo mudo. Hoje em dia ninguém te telefona, nos mandam um inbox, uma mensagem... Nos aproveitamos disso para sermos quem nós queremos que as pessoas nos vejam, Botamos uma foto bacana no perfil, fazemos uns "selfies" com bebidas, contamos que fomos tomar banho, que estivemos com tal pessoa em tal lugar, que estamos nos relacionando com tal pessoa, que na maioria das vezes mudamos semanalmente, ou seja vivemos uma bela mentira inventada por nós mesmos. Isso é futilidade, não temos coragem de assumir quem realmente somos, de procurar conhecer pessoas somente na rede. Somos personagens fúteis e altamente desprezíveis.


HMB: Mas essa fragilidade humana não é uma novidade que a tecnologia ou o anonimato da rede nos trouxe, ele já estava ai, em menores proporções e em nichos menores. Você acha que com a liberdade que a Internet nos trás, as pessoas criam um mundo somente delas e se afastam, de certa forma, do convívio social?
Michele: A verdade é que o ser humano sempre se afasta. Ninguém quer ter responsabilidade por ninguém. Se formos analisar de forma categórica isso se deve a evolução das espécies. No momento que o homem parou de caçar e começou a delimitar territórios, ele já se tornou individualista. Essa é a natureza humana atual, não precisamos mais viver em grupos pela sobrevivência. A internet é ambígua. Ao mesmo tempo que, estamos sós, temos milhares de pessoas conectadas a nós. Puxa, isso daria para escrever vários livros (risos).


HMB: E existe uma Michele Dupont escritora?
Michele: Sim. Tenho até uma página que divulgo alguns contos de terror/suspense. Chama-se Senhora dos Ossos. Tem poucos "likes", mas muitas visualizações. Não vejo a hora de poder me dedicar mais á isso. Quando era criança, passava horas na biblioteca da escola, acho que havia lido mais da metade em menos de dois anos. Com dez anos o que me marcou foi ler Olga. E resolvi mudar, queria ser uma mulher forte, lutadora. Escrevia muito, sempre em forma de protesto. Hoje quero fazer algo mais direcionado á fantasia, ficção. Estou trabalhando em um livro, mas esse é top secret.

HMB: Top Secret? Nem uma dica?
Michele: Aguardem...

HMB: Planos para o futuro?
Michele: Futuro... Prefiro planejar o meu presente, já está complicado (risos), quem dirá meu futuro. Nunca espero nada dele, o aqui e o agora é o que tem me motiva.

HMB: Resuma Michele Dupont em uma palavra ou frase.
Michele: "Se mal lidam com meu melhor, quem dirá do meu pior."

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo,  deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.

Michele: Sejam vocês mesmos, é dolorido, muitas portas vão bater em suas caras, muitas pessoas vão falar de você, muitos te amaram e a maioria te odiará, sentirá coisas que corroem sua alma, mas no final, todas essas cicatrizes vão provar a pessoa que você se tornou. E sempre, apoie quem você ama.

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