Apesar de anos afastado do cenário Heavy Metal, Henrique
Soares Pessoa, mais conhecido pela alcunha de Henrique "Poço", fez
história... Melhor, foi parte importante da história do Heavy Metal nacional,
gravou com a banda Anthares o emblemático e elevado à categoria de clássico
absoluto, “No Limite da Força”, fez shows ao lado de nomes importantes da cena
e por um motivo do destino, desapareceu. Por quê? Você confere a seguir...
HM Breakdown: Olá Henrique, obrigado pelo seu tempo
e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, nos fale sobre você e suas
atividades.
Henrique "Poço" Soares: Bom, tenho 50 anos, passei por dois casamentos e tenho
cinco filhos (risos), moro no litoral sul de Pernambuco, e sou representante
comercial na área de material de construção. Estou sempre viajando pra visitar
os meus clientes e nos finais de semana estou em casa.
HMB: Você se tornou um ícone do cenário Heavy Metal brasileiro
por ter sido vocalista do Anthares, quais as suas lembranças dessa época?
Henrique: As lembranças são as melhores, lembro-me onde tudo
começou, foi na Vila Mariana quando tinha mais ou menos 15 anos e me
apresentaram um LP do Deep Purple, Made in Japan, eu enlouqueci, depois, vieram
e me apresentaram UFO, Blue Oyster Cult, Black Sabbath, Jimmy Hendrix e outros.
Mas o que me influenciou a gostar de rock mesmo foi AC/DC, depois vieram Iron
Maiden, entre outros. Eu morava na Vila Mariana e por volta dos anos 80, me
mudei para o bairro Cerqueira César, na Alameda Franca, onde conheci os
integrantes do Anthares, eu tinha um projeto de banda que se chamava Sabotage,
era vizinho de parede de Evandro Júnior e morávamos numa vila com seis casas, e
mais adiante morava na mesma rua o Aranha ,foi quando numa pelada fiquei
conhecendo os caras todos, começamos a curtir juntos ir aos shows, Woodstock e
galeria do Rock e começamos a andar juntos e surgiu, a ideia de montarmos uma
banda, fizemos duas letras e com um violão de uma corda (o mizão) compomos umas
músicas que se chamavam Cães Selvagens e Fúria, gravamos e começamos a mostrar
ao pessoal e houve uma aceitação, o pessoal se movimentou, compramos os
instrumentos, eu na realidade queria tocar baixo, sempre sem grana, optei por
ser vocalista (risos), começamos a ensaiar, a banda se chamava Fúria e com os
seguintes integrantes: Henrique Pessoa, vocal, Júnior, batera, Aranha, guitarra
base, Fabiola, guitarra solo e Guilherme, baixo, em meados de 82, tocamos em um
festival de um colégio, no qual ganhamos em primeiro lugar, como a melhor banda
de Rock, e nos fortalecemos para continuar com o projeto, e com a saída da
Fabiola e do Guilherme, montamos o Anthares com o Cristian na guitarra solo,
faltava um baixo para completar a banda, foi quando contratamos o Carioca
(Marcelo Aquino), com o Carioca a banda deu uma levantada harmônica nesse tempo
já tínhamos umas cinco músicas, e quando abrimos o show do Tithanio, do grande guitarrista Euphasio e
nesse show estava os caras da Rock Brigade, nós tocamos See You in Hell do Grim
Reaper, os caras piraram. E saiu uma pequena nota na Rock Brigade sobre a banda
e a versão do Grim Reaper, os comentários foram os melhores, e naturalmente
fomos atualizando o som, com o tempo dispensamos o baixista Carioca (por
motivos ideológicos e musicais) e contratamos o Pardal, estava formado o Anthares
do "No Limite da Força", o movimento foi crescendo a velocidade e o
peso aumentando.
As coisas foram acontecendo naturalmente, conhecemos os
caras do Minotauro, que conheciam os caras do Sepultura, começamos a interagir,
e o grande boom da banda foi o show no Rainbow Bar com o Desaster, quando num
pequeno espaço colocamos mais de 500 bangers, batendo recorde de público. E
quanto a minha participação no cenário metal brasileiro as coisas iam
acontecendo na maior naturalidade, eu nunca fui poser por que tinha uma banda
conceituada no meio, mas não era por causa disso que após um show eu ia para a
churrascaria ou dormir, não, eu ia tomar umas com os bangers e as mazelas das
ruas que estavam disponíveis. Sempre fui um cara conceituado não só no meio
metal, mais no meio Hardcore e carecas, por que sempre fui verdadeiro nas
minhas afirmações, eu vivi os bueiros do Underground! Vivi o movimento na sua
essência, sexo, drogas e Metal puro e porrada, contemplei todas as mazelas da
sociedade das décadas de 80 e 90, de entrar numa favela as duas da madrugada
pra comprar pó, de coturno camisa de banda, isso aconteceu depois do show no
Clube dos Aeroviários com Ratos de Porão, Sepultura, etc... O inferno para mim
não era o limite, o meu limite era muito mais, dormi varias vezes numa favela
de Santo André, noites e noites ligado, sempre mantendo atitude e respeito às
pessoas por onde passei, e nas letras eu colocava isso que eu vivia e pensava
ser o certo, Paranoia Final, Batalhas Ocultas, Prisioneiros do Sistema e outras.
Mas o guerreiro teve que recuar! A dependência veio além do
limite que estava estipulado para o corpo e para a alma, o recuo foi eminente e
necessário, pedi dispensa da banda e viajei para o Nordeste, logo casei e do
primeiro casamento tive dois lindos filhos e do segundo uma filha linda, de
cinco anos e mais dois filhos adotados, num total cinco (risos), nos somos
sobreviventes do fim, por que para mim o fim, foi na década de 80, se nos
estamos aqui ainda é por que acredito que nada se fez de novo, tudo que temos
hoje, em termos de som (bandas novas) e movimento, nos vivemos na década de 80,
o que rola e apenas uma continuidade quase que sem alteração do que houve no
passado.
HMB: Você me disse uma vez, assim da sua saída do Anthares, que
estava com ideia de montar uma nova banda, que ias e chamar Hearnoise, ou algo
assim, confere a informação?
Henrique: Não me lembro, mais quando eu sai do “Anthas”,
queria fazer um projeto Hardcore, depois que eu fui para o show do Anthares no
Dynamo, o primeiro show da banda sem a minha voz, foi complicado, ali doeu,
fingi estar bem, mais na realidade, não estava, ai passou pela cabeça de tocar
em uma banda, fui fazer um som com o Tithanio do Eufhrasio, fizemos duas
musicas alguns ensaios, mais não vingou.
HMB: E logo em seguida você sumiu da cena, e tão rápido
quanto isso, começaram a surgir boatos sobre você, como seu falecimento, sua
conversão a alguma igreja, e essas coisas, O que aconteceu com você de verdade?
Henrique: Minha saída foi inicio de 90, pouco tempo depois
os caras colocaram o Japonês no vocal, eu fui ao show de estreia do novo vocal
no Dynamo, foi ai que me deu uma sensação de dor, mais ai eu comecei a focar no
meu trabalho planejando ir para o Nordeste, recebi um convite do Euphasio e do
Vichté pra cantar no Tithanio, mas não vingou. A distancia e minha voz não se
enquadrou no som. Em julho de 90 fui demitido, peguei a mochila e fui para o Recife
e nesse tempo eu estava limpo das drogas, sentia a vontade de mudar de vida,
logo em Recife arrumei um trampo, comecei a namorar e logo casei. Minha esposa
era um pouco religiosa, começamos a frequentar a igreja de leve, e logo comecei
a ganhar uma grana, dai vieram as bebedeiras e caí de novo na droga, começou
como uma curtição depois se transformou em vicio, passei cinco anos na
escuridão, de 96 a 2000, foi quando eu tive uma experiência mais profunda com o
Cristianismo, através do convite de um casal amigo, fui participar do encontro
de casais, frequentei realmente a igreja católica, foi quando eu conheci profundamente
a Palavra, houve da minha parte uma entrega fiel a Jesus, onde eu comungava e
vivia em pleno espirito, passei cinco anos na Graça, mais uma vez por volta de
2004, conheci uma cara que fazia o refino, pronto mais uma recaída. Passei
longos cinco anos fodido, eu estava na mão do patrão, estabilizado
profissionalmente, e no meu segundo casamento, em 2009, tive uma overdose, foi
quando eu dei um basta, pois juntei a experiência da igreja com o amor da
família e estou superando dia a dia, numa "batalha oculta" diária.
HMB: Uma coisa que me marcou muito foi a sua participação no
show do Anthares, novamente com o Desaster no Dynamo em 2012, onde você subiu
ao palco, cantou com os caras e ainda teve uma brincadeira do Diego Nogueira
Sábio, atual vocalista do Anthares sobre o seu sumiço, vi aquilo como uma
passagem de comando sua para o Diego. Aquele acontecido além de um dos momentos
mais emblemáticos do show, foi muito simbólico para quem viveu o cenário nos
anos 80. Quais foram os seus sentimentos diante daquilo?
Henrique: Então JP, quando houve a overdose, eu estava
dirigindo e de repente apaguei, foi quando decidi mudar, com três filhos eu não
podia continuar, pedi forças as milícias dos céus, do cosmo e do universo
inteiro. Comecei a trabalhar incessantemente e comecei a progredir. Mudei de Recife
para o interior, litoral sul, fiquei longe das mazelas da cidade grande, e
recomecei uma nova vida, pois depois que cheguei à Recife tive três recaídas,
com o meu trabalho, fui tendo reconhecimento nas empresas onde sou
representante comercial e fui convidado, depois de ser o primeiro lugar em
vendas do Brasil, para ir para o Paraná conhecer a indústria e com isso comecei
ir para São Paulo participar de feiras e eventos na Área de construção civil, foi
quando com o Orkut comecei a procurar os meus amigos, e nisso fui vendo que o
movimento estava firme e forte, o Underground continuava aceso e muitas bandas
estavam voltando na cena, e que eu, o bom e velho Poço, um cara que ficou
marcado no cenário, não só pelas loucuras, mais como um dos que mais lutou pela
causa do Metal no Brasil, o cara que não tinha tempo ruim, chegava e acontecia.
Quando em 2009, comecei a ir aos ensaios do Anthares, os caras tiveram este
pensamento de fazer um som comigo, e o Diego sempre me deixou a vontade, ai em
2010 numas dessas viagens os caras me pregaram uma peça, bolaram uma
apresentação com varias bandas no Jaraguá, num point muito louco, que não vem o
nome a lembrança, e fizeram a primeira homenagem, foi impressionante a sensação
que senti naquela noite, eu fui dormir de alma lavada, por que me passou um
filme de tudo que fiz, apesar das loucuras, valeu a pena, as pessoas vinha me
cumprimentar, como se eu fosse um deus na sua mais completa autoridade, e foi
crescendo em mim a necessidade de fazer algo pela causa que tanto lutei e tive
que recuar para voltar um dia mais forte e provar para aqueles (mesmo que
inconsciente) que me chamavam de "baianinho drogado", que é possível mudar
de vida, é possível dar a volta por cima. Veio o Facebook e com ele muitos
amigos que se perderam no tempo vieram a tona, estavam vivos e cuidando de suas
famílias, lindo isso cara! Encheu o espírito, foi em 2012, me pregaram outra
peça, e essa foi mais contundente ainda. De fazer chorar. Naquela noite
fatídica de 17 de dezembro de 2012, eu tive um colapso, ao ver tanta gente,
igual aos dias de Woodstock, eu via tanta gente reunida, para presenciar um
evento que aconteceu há 25 anos! Cara, eu tive uma dor nesta noite no meu braço
de tanto (acho) apertar a mão dos meus amigos, Esta dor permaneceu em mim
durante dois anos, inflamou o meu tendão, vi pessoas como você, Gepeto, Deyser Aguiar, Gregão, Carneiro, Guigui, Fallador, Pezão, Marco Zafir (Lobotomia), Aranha,
Amado, Weber, Nicolas Heibrhon e o Beto (irmão do Evandro) que nunca foi em um
show do Anthares e outros que não me recordo agora, aproximadamente 300
pessoas. Esta data mexeu muito com meus sentimentos mais profundos de amizade, carinho
e reconhecimento.
HMB: Então definitivamente você passou o bastão para o Diego
no palco do Dynamo? Que na minha forma de entender foi a grande achado do
Anthares, até porque depois de você, ele foi o cara que fez com que a banda
desse vários passos adiante.
Henrique: Foi, naturalmente em vida tive a oportunidade de
passar para o Diego, naquele momento, a responsabilidade de me substituir na
integra em grande estilo, o microfone do Anthares, e compartilhar com os outros
vocalistas, o Japonês e o Frank, aquele grande momento de nossas vidas, que o Anthares
apesar de ter só um disco gravado,
atravessou o inicio, o meio e esta atravessando o fim com esta formação e com a mesma pegada e
ideologia.
HMB: E você ainda vivencia o cenário Heavy Metal da sua
cidade ou acompanha o que acontece?
Henrique: Por volta de 2009, quando comecei a viajar para o Sul
do país e interagir com o pessoal das
antigas e com isso, comecei a comprar discos participar de shows e festivais, hoje
sempre que posso estou no cenário, estive no M.O.A em São Luís, no ano passado
fui para Fortaleza assistir o Anthares e de 2009 para cá não perdi nenhuma
edição do Abril Pro Rock, e por fim participei da gravação do CD da banda Realidade
Encoberta.
HMB: Fico feliz em saber! Como foi para você entrar em
estúdio e gravar, mesmo que só uma participação?
Henrique: Foi o máximo, os caras me deixaram muito a vontade
para por a letra dentro da música, me surpreendeu que eu não precisei de muito
tempo, na primeira peguei o tom, e cantei essa letra: Militares, políticos e
religiosos, fodam-se... Militares, políticos e religiosos fodam-se (risos),nesse
dia se juntou o vocal do Oddium (Jorge Picasso) que também fez uma participação
nesta mesma música, antes disso também
gravei uma musica que era instrumental do projeto Aracnus, que se chama
Sobreviventes do Fim, fiz a letra e encaixei na musica (Favor ver no You Tube: Aracnus: Sobreviventes do Fim), ainda falta
melhorar a voz na gravação, mais dá para ter uma ideia do que vem por ai.
HMB: Planos para o futuro?
Henrique: Bom meus planos para o futuro são, primeiro me
estabilizar no meu seguimento profissional para garantir minha aposentadoria,
pois sou microempresário e nesse país de merda, somos escravizados a pagar 50%
do nosso trabalho com impostos, pretendo trabalhar focado e forçado por dez
anos para com 60 anos eu possa me dedicar a produzir shows, fazer um curso de
fotografia e viajar pelo Brasil e o mundo, e quem sabe escrever um livro de
memorias, se é que eu na minha sanidade vou conseguir me lembrar de alguma
coisa (risos), e quero dizer que tudo o que aconteceu na minha vida tinha que
ser assim, compromisso zero e loucuras sem fim, mas durante os sete anos de
banda Anthares tudo o que fizemos foi muito natural, sem esforço para ser o que
não erámos na verdade, sempre fomos verdadeiros com nossas ações e sem firulas
e muitos posers filhos da puta, que andavam conosco rasgados eram só de embalo,
um bando de bosta humana se diziam Headbangers mais na verdade, era só pra
contrariar os pais e que hoje se acham os promissores do movimento de 80, mais
que na realidade eram uns playboyzinhos fezes acumuladas, encontrei vários
nessas andanças do meu retorno (risos).
HMB: Resuma Henrique "Poço" Soares Pessoa em uma palavra ou
frase.
Henrique: Não quero ser lembrado só pelas loucuras, e sim
pelas atitudes que engrandeceram o movimento e também como um exemplo de que
você pode mudar sua vida, basta crer primeiramente numa força maior que rege o
universo (Deus) e segundo, você entender que você é o centro de tudo a sua
volta, e quero também ser lembrado, porque um menino pobre e nordestino saiu fodido
de Recife com seis anos de idade, sem nenhuma perspectiva de vida e com uma mão
na frente e outra atrás, chegou na megametrópole fez história, caiu e voltou
pra sua terra lutou e venceu, sendo
admirado profissionalmente e como pai de família e pai de cinco filhos, esse é
o legado que eu quero deixar para os meus filhos e amigos que sempre
acreditaram em mim, que a minha historia foi escrita com alegria, loucura, trabalho,
sangue e sabedoria também. Vou resumir o bom e velho "Poço" como uma Metalmorfose
Ambulante, pois sempre estou me ajustando no tempo e espaço.
HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este
belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Henrique: Vou deixar para os jovens o seguinte conselho: não
ultrapassem "No Limite da Força", por que teremos uma "Batalha Oculta"
no universo oculto de cada um, para não se tornar um "Prisioneiro do Sistema"
esqueça a "Vingança", por que, se permanecer na "Paranóia Final"
isto pode lhe trazer "Fúria" e consequentemente o instinto animal
pode levar a executar uma "Chacina", um abraço a todos e quem puder
mais chora menos, abraço meu caro JP, em lagrimas eu me disperso por aqui. Grato!
Sensacional e emocionante essa entrevista! Banger de verdade. E mais do que isso: de atitude!
ResponderExcluirLegal, na época do Orkut nos éramos contato, fico feliz em ver o ressurgimento do guerreiro.
ResponderExcluirBom ver o retorno do guerreiro
ResponderExcluirSensacional entrevista!!! Me fez chorar!!! Henrique querido, muito sucesso e felicidade!!! Fico orgulhosa por ter sido sua amiga nos anos 80 e por ver sua luta e sua vitória! O tempo nos afastou, mas as boas lembranças ficarão para sempre!!!
ResponderExcluirCaralho eu estive no show do aeroviários!!!!!
ResponderExcluirHistória viva do metal nacional!!! Grande Henrique Poço.
ResponderExcluirParabéns pela entrevista JP e #BIGPOÇO, eterno irmão de longas histórias !!! Saúde força e sucesso para vcs garotos !
ResponderExcluirBlá blá blá... Agora me paga aquela grana que tu me extorquiu pra comprar passagem de ônibus (deve ter comprado pó). Lembra?
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