quinta-feira, 22 de maio de 2014

Henrique "Poço" Soares, vivo... E pronto para a guerra...


Apesar de anos afastado do cenário Heavy Metal, Henrique Soares Pessoa, mais conhecido pela alcunha de Henrique "Poço", fez história... Melhor, foi parte importante da história do Heavy Metal nacional, gravou com a banda Anthares o emblemático e elevado à categoria de clássico absoluto, “No Limite da Força”, fez shows ao lado de nomes importantes da cena e por um motivo do destino, desapareceu. Por quê? Você confere a seguir...


HM Breakdown: Olá Henrique, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, nos fale sobre você e suas atividades.
Henrique "Poço" Soares: Bom, tenho 50 anos, passei por dois casamentos e tenho cinco filhos (risos), moro no litoral sul de Pernambuco, e sou representante comercial na área de material de construção. Estou sempre viajando pra visitar os meus clientes e nos finais de semana estou em casa.

HMB: Você se tornou um ícone do cenário Heavy Metal brasileiro por ter sido vocalista do Anthares, quais as suas lembranças dessa época?
Henrique: As lembranças são as melhores, lembro-me onde tudo começou, foi na Vila Mariana quando tinha mais ou menos 15 anos e me apresentaram um LP do Deep Purple, Made in Japan, eu enlouqueci, depois, vieram e me apresentaram UFO, Blue Oyster Cult, Black Sabbath, Jimmy Hendrix e outros. Mas o que me influenciou a gostar de rock mesmo foi AC/DC, depois vieram Iron Maiden, entre outros. Eu morava na Vila Mariana e por volta dos anos 80, me mudei para o bairro Cerqueira César, na Alameda Franca, onde conheci os integrantes do Anthares, eu tinha um projeto de banda que se chamava Sabotage, era vizinho de parede de Evandro Júnior e morávamos numa vila com seis casas, e mais adiante morava na mesma rua o Aranha ,foi quando numa pelada fiquei conhecendo os caras todos, começamos a curtir juntos ir aos shows, Woodstock e galeria do Rock e começamos a andar juntos e surgiu, a ideia de montarmos uma banda, fizemos duas letras e com um violão de uma corda (o mizão) compomos umas músicas que se chamavam Cães Selvagens e Fúria, gravamos e começamos a mostrar ao pessoal e houve uma aceitação, o pessoal se movimentou, compramos os instrumentos, eu na realidade queria tocar baixo, sempre sem grana, optei por ser vocalista (risos), começamos a ensaiar, a banda se chamava Fúria e com os seguintes integrantes: Henrique Pessoa, vocal, Júnior, batera, Aranha, guitarra base, Fabiola, guitarra solo e Guilherme, baixo, em meados de 82, tocamos em um festival de um colégio, no qual ganhamos em primeiro lugar, como a melhor banda de Rock, e nos fortalecemos para continuar com o projeto, e com a saída da Fabiola e do Guilherme, montamos o Anthares com o Cristian na guitarra solo, faltava um baixo para completar a banda, foi quando contratamos o Carioca (Marcelo Aquino), com o Carioca a banda deu uma levantada harmônica nesse tempo já tínhamos umas cinco músicas, e quando abrimos o show  do Tithanio, do grande guitarrista Euphasio e nesse show estava os caras da Rock Brigade, nós tocamos See You in Hell do Grim Reaper, os caras piraram. E saiu uma pequena nota na Rock Brigade sobre a banda e a versão do Grim Reaper, os comentários foram os melhores, e naturalmente fomos atualizando o som, com o tempo dispensamos o baixista Carioca (por motivos ideológicos e musicais) e contratamos o Pardal, estava formado o Anthares do "No Limite da Força", o movimento foi crescendo a velocidade e o peso aumentando.


As coisas foram acontecendo naturalmente, conhecemos os caras do Minotauro, que conheciam os caras do Sepultura, começamos a interagir, e o grande boom da banda foi o show no Rainbow Bar com o Desaster, quando num pequeno espaço colocamos mais de 500 bangers, batendo recorde de público. E quanto a minha participação no cenário metal brasileiro as coisas iam acontecendo na maior naturalidade, eu nunca fui poser por que tinha uma banda conceituada no meio, mas não era por causa disso que após um show eu ia para a churrascaria ou dormir, não, eu ia tomar umas com os bangers e as mazelas das ruas que estavam disponíveis. Sempre fui um cara conceituado não só no meio metal, mais no meio Hardcore e carecas, por que sempre fui verdadeiro nas minhas afirmações, eu vivi os bueiros do Underground! Vivi o movimento na sua essência, sexo, drogas e Metal puro e porrada, contemplei todas as mazelas da sociedade das décadas de 80 e 90, de entrar numa favela as duas da madrugada pra comprar pó, de coturno camisa de banda, isso aconteceu depois do show no Clube dos Aeroviários com Ratos de Porão, Sepultura, etc... O inferno para mim não era o limite, o meu limite era muito mais, dormi varias vezes numa favela de Santo André, noites e noites ligado, sempre mantendo atitude e respeito às pessoas por onde passei, e nas letras eu colocava isso que eu vivia e pensava ser o certo, Paranoia Final, Batalhas Ocultas, Prisioneiros do Sistema e outras.
Mas o guerreiro teve que recuar! A dependência veio além do limite que estava estipulado para o corpo e para a alma, o recuo foi eminente e necessário, pedi dispensa da banda e viajei para o Nordeste, logo casei e do primeiro casamento tive dois lindos filhos e do segundo uma filha linda, de cinco anos e mais dois filhos adotados, num total cinco (risos), nos somos sobreviventes do fim, por que para mim o fim, foi na década de 80, se nos estamos aqui ainda é por que acredito que nada se fez de novo, tudo que temos hoje, em termos de som (bandas novas) e movimento, nos vivemos na década de 80, o que rola e apenas uma continuidade quase que sem alteração do que houve no passado.

HMB: Você me disse uma vez, assim da sua saída do Anthares, que estava com ideia de montar uma nova banda, que ias e chamar Hearnoise, ou algo assim, confere a informação?
Henrique: Não me lembro, mais quando eu sai do “Anthas”, queria fazer um projeto Hardcore, depois que eu fui para o show do Anthares no Dynamo, o primeiro show da banda sem a minha voz, foi complicado, ali doeu, fingi estar bem, mais na realidade, não estava, ai passou pela cabeça de tocar em uma banda, fui fazer um som com o Tithanio do Eufhrasio, fizemos duas musicas alguns ensaios, mais não vingou.

HMB: E logo em seguida você sumiu da cena, e tão rápido quanto isso, começaram a surgir boatos sobre você, como seu falecimento, sua conversão a alguma igreja, e essas coisas, O que aconteceu com você de verdade?
Henrique: Minha saída foi inicio de 90, pouco tempo depois os caras colocaram o Japonês no vocal, eu fui ao show de estreia do novo vocal no Dynamo, foi ai que me deu uma sensação de dor, mais ai eu comecei a focar no meu trabalho planejando ir para o Nordeste, recebi um convite do Euphasio e do Vichté pra cantar no Tithanio, mas não vingou. A distancia e minha voz não se enquadrou no som. Em julho de 90 fui demitido, peguei a mochila e fui para o Recife e nesse tempo eu estava limpo das drogas, sentia a vontade de mudar de vida, logo em Recife arrumei um trampo, comecei a namorar e logo casei. Minha esposa era um pouco religiosa, começamos a frequentar a igreja de leve, e logo comecei a ganhar uma grana, dai vieram as bebedeiras e caí de novo na droga, começou como uma curtição depois se transformou em vicio, passei cinco anos na escuridão, de 96 a 2000, foi quando eu tive uma experiência mais profunda com o Cristianismo, através do convite de um casal amigo, fui participar do encontro de casais, frequentei realmente a igreja católica, foi quando eu conheci profundamente a Palavra, houve da minha parte uma entrega fiel a Jesus, onde eu comungava e vivia em pleno espirito, passei cinco anos na Graça, mais uma vez por volta de 2004, conheci uma cara que fazia o refino, pronto mais uma recaída. Passei longos cinco anos fodido, eu estava na mão do patrão, estabilizado profissionalmente, e no meu segundo casamento, em 2009, tive uma overdose, foi quando eu dei um basta, pois juntei a experiência da igreja com o amor da família e estou superando dia a dia, numa "batalha oculta" diária.


HMB: Uma coisa que me marcou muito foi a sua participação no show do Anthares, novamente com o Desaster no Dynamo em 2012, onde você subiu ao palco, cantou com os caras e ainda teve uma brincadeira do Diego Nogueira Sábio, atual vocalista do Anthares sobre o seu sumiço, vi aquilo como uma passagem de comando sua para o Diego. Aquele acontecido além de um dos momentos mais emblemáticos do show, foi muito simbólico para quem viveu o cenário nos anos 80. Quais foram os seus sentimentos diante daquilo?
Henrique: Então JP, quando houve a overdose, eu estava dirigindo e de repente apaguei, foi quando decidi mudar, com três filhos eu não podia continuar, pedi forças as milícias dos céus, do cosmo e do universo inteiro. Comecei a trabalhar incessantemente e comecei a progredir. Mudei de Recife para o interior, litoral sul, fiquei longe das mazelas da cidade grande, e recomecei uma nova vida, pois depois que cheguei à Recife tive três recaídas, com o meu trabalho, fui tendo reconhecimento nas empresas onde sou representante comercial e fui convidado, depois de ser o primeiro lugar em vendas do Brasil, para ir para o Paraná conhecer a indústria e com isso comecei ir para São Paulo participar de feiras e eventos na Área de construção civil, foi quando com o Orkut comecei a procurar os meus amigos, e nisso fui vendo que o movimento estava firme e forte, o Underground continuava aceso e muitas bandas estavam voltando na cena, e que eu, o bom e velho Poço, um cara que ficou marcado no cenário, não só pelas loucuras, mais como um dos que mais lutou pela causa do Metal no Brasil, o cara que não tinha tempo ruim, chegava e acontecia. Quando em 2009, comecei a ir aos ensaios do Anthares, os caras tiveram este pensamento de fazer um som comigo, e o Diego sempre me deixou a vontade, ai em 2010 numas dessas viagens os caras me pregaram uma peça, bolaram uma apresentação com varias bandas no Jaraguá, num point muito louco, que não vem o nome a lembrança, e fizeram a primeira homenagem, foi impressionante a sensação que senti naquela noite, eu fui dormir de alma lavada, por que me passou um filme de tudo que fiz, apesar das loucuras, valeu a pena, as pessoas vinha me cumprimentar, como se eu fosse um deus na sua mais completa autoridade, e foi crescendo em mim a necessidade de fazer algo pela causa que tanto lutei e tive que recuar para voltar um dia mais forte e provar para aqueles (mesmo que inconsciente) que me chamavam de "baianinho drogado", que é possível mudar de vida, é possível dar a volta por cima. Veio o Facebook e com ele muitos amigos que se perderam no tempo vieram a tona, estavam vivos e cuidando de suas famílias, lindo isso cara! Encheu o espírito, foi em 2012, me pregaram outra peça, e essa foi mais contundente ainda. De fazer chorar. Naquela noite fatídica de 17 de dezembro de 2012, eu tive um colapso, ao ver tanta gente, igual aos dias de Woodstock, eu via tanta gente reunida, para presenciar um evento que aconteceu há 25 anos! Cara, eu tive uma dor nesta noite no meu braço de tanto (acho) apertar a mão dos meus amigos, Esta dor permaneceu em mim durante dois anos, inflamou o meu tendão, vi pessoas como você, Gepeto, Deyser Aguiar, Gregão, Carneiro, Guigui, Fallador, Pezão, Marco Zafir (Lobotomia), Aranha, Amado, Weber, Nicolas Heibrhon e o Beto (irmão do Evandro) que nunca foi em um show do Anthares e outros que não me recordo agora, aproximadamente 300 pessoas. Esta data mexeu muito com meus sentimentos mais profundos de amizade, carinho e reconhecimento.


HMB: Então definitivamente você passou o bastão para o Diego no palco do Dynamo? Que na minha forma de entender foi a grande achado do Anthares, até porque depois de você, ele foi o cara que fez com que a banda desse vários passos adiante.
Henrique: Foi, naturalmente em vida tive a oportunidade de passar para o Diego, naquele momento, a responsabilidade de me substituir na integra em grande estilo, o microfone do Anthares, e compartilhar com os outros vocalistas, o Japonês e o Frank, aquele grande momento de nossas vidas, que o Anthares apesar de ter só um disco gravado,  atravessou o inicio, o meio e esta atravessando o fim  com esta formação e com a mesma pegada e ideologia.

HMB: E você ainda vivencia o cenário Heavy Metal da sua cidade ou acompanha o que acontece?
Henrique: Por volta de 2009, quando comecei a viajar para o Sul do país  e interagir com o pessoal das antigas e com isso, comecei a comprar discos participar de shows e festivais, hoje sempre que posso estou no cenário, estive no M.O.A em São Luís, no ano passado fui para Fortaleza assistir o Anthares e de 2009 para cá não perdi nenhuma edição do Abril Pro Rock, e por fim participei da gravação do CD da banda Realidade Encoberta.

HMB: Fico feliz em saber! Como foi para você entrar em estúdio e gravar, mesmo que só uma participação?
Henrique: Foi o máximo, os caras me deixaram muito a vontade para por a letra dentro da música, me surpreendeu que eu não precisei de muito tempo, na primeira peguei o tom, e cantei essa letra: Militares, políticos e religiosos, fodam-se... Militares, políticos e religiosos fodam-se (risos),nesse dia se juntou o vocal do Oddium (Jorge Picasso) que também fez uma participação nesta mesma música, antes disso também  gravei uma musica que era instrumental do projeto Aracnus, que se chama Sobreviventes do Fim, fiz a letra e encaixei na musica (Favor ver no You Tube:  Aracnus: Sobreviventes do Fim), ainda falta melhorar a voz na gravação, mais dá para ter uma ideia do que vem por ai.


HMB: Planos para o futuro?
Henrique: Bom meus planos para o futuro são, primeiro me estabilizar no meu seguimento profissional para garantir minha aposentadoria, pois sou microempresário e nesse país de merda, somos escravizados a pagar 50% do nosso trabalho com impostos, pretendo trabalhar focado e forçado por dez anos para com 60 anos eu possa me dedicar a produzir shows, fazer um curso de fotografia e viajar pelo Brasil e o mundo, e quem sabe escrever um livro de memorias, se é que eu na minha sanidade vou conseguir me lembrar de alguma coisa (risos), e quero dizer que tudo o que aconteceu na minha vida tinha que ser assim, compromisso zero e loucuras sem fim, mas durante os sete anos de banda Anthares tudo o que fizemos foi muito natural, sem esforço para ser o que não erámos na verdade, sempre fomos verdadeiros com nossas ações e sem firulas e muitos posers filhos da puta, que andavam conosco rasgados eram só de embalo, um bando de bosta humana se diziam Headbangers mais na verdade, era só pra contrariar os pais e que hoje se acham os promissores do movimento de 80, mais que na realidade eram uns playboyzinhos fezes acumuladas, encontrei vários nessas andanças do meu retorno (risos).

HMB: Resuma Henrique "Poço" Soares Pessoa em uma palavra ou frase.
Henrique: Não quero ser lembrado só pelas loucuras, e sim pelas atitudes que engrandeceram o movimento e também como um exemplo de que você pode mudar sua vida, basta crer primeiramente numa força maior que rege o universo (Deus) e segundo, você entender que você é o centro de tudo a sua volta, e quero também ser lembrado, porque um menino pobre e nordestino saiu fodido de Recife com seis anos de idade, sem nenhuma perspectiva de vida e com uma mão na frente e outra atrás, chegou na megametrópole fez história, caiu e voltou pra sua terra lutou  e venceu, sendo admirado profissionalmente e como pai de família e pai de cinco filhos, esse é o legado que eu quero deixar para os meus filhos e amigos que sempre acreditaram em mim, que a minha historia foi escrita com alegria, loucura, trabalho, sangue e sabedoria também. Vou resumir o bom e velho "Poço" como uma Metalmorfose Ambulante, pois sempre estou me ajustando no tempo e espaço.


HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Henrique: Vou deixar para os jovens o seguinte conselho: não ultrapassem "No Limite da Força", por que teremos uma "Batalha Oculta" no universo oculto de cada um, para não se tornar um "Prisioneiro do Sistema" esqueça a "Vingança", por que, se permanecer na "Paranóia Final" isto pode lhe trazer "Fúria" e consequentemente o instinto animal pode levar a executar uma "Chacina", um abraço a todos e quem puder mais chora menos, abraço meu caro JP, em lagrimas eu me disperso por aqui. Grato!

8 comentários:

  1. Sensacional e emocionante essa entrevista! Banger de verdade. E mais do que isso: de atitude!

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  2. Legal, na época do Orkut nos éramos contato, fico feliz em ver o ressurgimento do guerreiro.

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  3. Sensacional entrevista!!! Me fez chorar!!! Henrique querido, muito sucesso e felicidade!!! Fico orgulhosa por ter sido sua amiga nos anos 80 e por ver sua luta e sua vitória! O tempo nos afastou, mas as boas lembranças ficarão para sempre!!!

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  4. Caralho eu estive no show do aeroviários!!!!!

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  5. História viva do metal nacional!!! Grande Henrique Poço.

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  6. Parabéns pela entrevista JP e #BIGPOÇO, eterno irmão de longas histórias !!! Saúde força e sucesso para vcs garotos !

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  7. Blá blá blá... Agora me paga aquela grana que tu me extorquiu pra comprar passagem de ônibus (deve ter comprado pó). Lembra?

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